«A frustração de não jogar fez bem a Bernardo Silva» – Entrevista BnR com João Tralhão

– O “clique” de Bernardo Silva –

BnR: Numa entrevista recente, recomendaste a Autobiografia do Sir Alex Ferguson. Coincidência, acabei de a ler há uma semana…

JT: [João ri-se com gosto] Espetáculo.

BnR: É dos melhores livros que já li, um autêntico manual de liderança. Sir Alex diz no livro que as estrelas com grandes egos não eram o problema que as pessoas achavam que era, porque elas precisam de vencer para massajar o seu próprio ego. Por isso, eles faziam o que fosse preciso para ganhar, ou seja, trabalhavam arduamente de forma consistente. Quem foram os jogadores que treinaste que foram o melhor exemplo disto?

JT: Ao nível sénior, já te disse. Eu acho que isso é uma característica comum. E quem melhor que Sir Alex Ferguson para relatar esse tipo de relação e para explicar o que isso significa? A nível sénior, tive vários exemplos. O Rui Costa, o Luisão, o Di María, o Nuno Gomes. Depois, no Monaco, jogadores como o Falcao, Fàbregas, Youri Tielemans. Tielemans era jogador fabuloso a nível de caráter, queria ganhar sempre. O Rony Lopes também tem o mesmo perfil, já me tinha cruzado com ele no Benfica.

BnR: E na formação?

JT: Muitos. Destaco aqueles que são mais recentes. Casos do João Félix, Bernardo Silva, Gonçalo Guedes, Renato Sanches, Diogo Gonçalves, Rúben Dias. Com jogadores que têm essa necessidade de ganhar não precisas de fazer muito. São egos já, mesmo na formação, bastante… Não dando um sentido pejorativo ao termo ego, quando digo ego são jovens que já acreditam nas suas capacidades, e têm tanta coisa à volta deles que aquilo de facto é comum a todos. Felizmente, durante a minha carreira, encontrei muitos jovens na formação com esse perfil. Destaquei alguns, mas havia muitos.

BnR: Outra lição deste livro, que é sobre Psicologia e a relação treinador-jogador. Sir Alex Ferguson diz que é fulcral dizer sempre a verdade, dividindo o feedback ao jogador entre crítica e encorajamento. Ou seja, fazê-lo tomar responsabilidade pelo seu desempenho, mas, ao mesmo tempo, dar a entender que ele consegue estar a um nível superior ao atual. É desta forma que procuras dar feedback aos teus jogadores?

JT: Sim. Na generalidade, há duas formas de criticares. Há uma que é a crítica por criticar, gratuita, e acho que qualquer pessoa, sobretudo no futebol, pode fazê-lo. Tanto aquele que sabe mais, como aquele que sabe menos, seja da área ou não. Mas aquilo que faz a diferença é a outra forma. Quando tu criticas, e concordo com esse capítulo… lembro-me de quando estive a fazer passagem pelo capítulo, e identifico-me na plenitude! Quando tu criticas, tens de ter noção que essa crítica é para te levar a algo.

BnR: Ou seja, com a postura de aprendizagem, de quem está a fazer um caminho.

JT: Sim, tens de ter um sentido projetivo. Criticar por criticar nunca leva a lado nenhum. Só se for uma coisa extremamente negativa, e mesmo que seja uma coisa extremamente negativa e fora daquilo que é o normal, eu acho que deves sempre dar oportunidade de o jogador se poder retratar e poder melhorar. Quando é uma crítica técnica sobre aquilo que ele faz no jogo, só tem sentido criticares num sentido projetivo. E, aí sim, vem a fase do encorajamento, e também a parte do desafio. Ou seja, criticas e crias um desafio novo – já o estás a encorajar a ser melhor.

BnR: Sentes que, hoje em dia, já se mudou um pouco o paradigma de que na formação só jogam os mais altos ou os mais fortes?

JT: Ainda não, não totalmente. Um projeto de formação é tu teres um caminho, ou seja, saberes exatamente o que é que pretendes dos jovens que estás a formar. Tendo um caminho, tu consegues, à partida, definir quais são as qualidades que queres e não queres num jovem, e não andar sempre a recorrer a outro tipo de qualidades que não te vão permitir alcançares um objetivo. Acho que há espaço para todos. Há vários projetos, muito diferenciados, que têm sucesso. Não é só com pequenos e tecnicamente evoluídos que tens sucesso. Há projetos com jogadores mais altos e fisicamente mais fortes que também têm sucesso. Mas o que é importante, para mim, é definir o caminho do processo para não teres o erro de teres uma heterogeneidade muito grande de jogadores. Pelo menos de perfil, características gerais, e que não te deixam tomar boas decisões naquilo que é o mais importante na formação, que é ajudar os jovens a alcançar um determinado objetivo.

BnR: Falávamos de jogadores fisicamente fortes e altos. Pergunto-te agora por alguém que, fisicamente, é o oposto disso. O que é que recordas dos tempos do Bernardo Silva na formação?

JT: Tenho excelentes recordações. Foi um menino que, quando chegou aos juniores, tinha passado por uma fase de alguma frustração por não ter sido tão regularmente utilizado. Essa frustração foi fundamental para ele perceber como era, de facto, a passagem do futebol de formação para um contexto mais profissional. Nos juniores, já é profissional, é diferente… fez-lhe bem essa frustração! E fez-lhe melhor ainda a resistência a essa frustração, ou seja, aquilo que ele teve de fazer para combater isso. Mérito dele, totalmente.

BnR: Houve um esforço da vossa parte para lhe proporcionar um ambiente que promovesse esse amadurecimento da parte dele?

JT: Sim, ele encontrou um ambiente para trabalhar que promoveu esse tipo de sentimento e esse tipo de ação da parte dele. Mas o mérito é dele. Dou-lhe ainda mais valor por isso. Foi ele que percebeu que tinha de mudar. Foi ele que trabalhou para mudar, e mudou muito a mentalidade, relativamente àquilo que era o futebol. Ele já era um miúdo super apaixonado pelo jogo, tinha qualidades inacreditáveis para um jovem daquela idade, mas faltava-lhe ainda ter a atitude certa para vingar no futebol profissional. Foi isso que ele fez, foi o clique que ele deu. Quando ele deu esse clique… nem preciso de falar, basta ir ver os registos e os vídeos que estão na Internet para perceber que tipo de jogador é que ele é. É um jogador completamente diferenciado de todos os outros da fornada dele. Neste momento, é um dos melhores do mundo.

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Frederico Seruya
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"It's not who I am underneath, but what I do, that defines me" - Bruce Wayne/Batman.                                                                                                                                                O O Frederico escreve ao abrigo do novo Acordo Ortográfico.

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