«António Salvador só não queria que eu fosse para o Benfica» – Entrevista BnR com Leandro Salino

    – Um Salino sem paciência para Domingos –

    «Fiquei muito muito chateado. Para te dizer a verdade, já nem tinha cabeça para o jogo. No fim do jogo nem na cara dele olhei»

    Bola na Rede: No Braga, em 2010/11, têm uma campanha europeia extraordinária. Como foi isso?

    Leandro Salino: Foi logo no meu primeiro ano de Braga. Conseguimos um feito histórico: levámos o Braga à [fase de grupos da] Liga dos Campeões pela primeira vez. Eliminámos o Sevilha [no play-off] e estivemos muito bem na Liga dos Campeões. Depois fomos para a Liga Europa…

    Bola na Rede: Chegaram mesmo a ganhar ao Arsenal.

    Leandro Salino: Isso, ganhámos na Liga dos Campeões. Depois, apanhámos equipas muito fortes na Liga Europa: Liverpool, Benfica… até que chegámos à final com o FC Porto. O país inteiro e o Porto estava a torcer pelo Braga. Foi um ano fabuloso, em que a equipa jogava muito bem, e que eu guardo até hoje na minha memória.

    Bola na Rede: Pelo caminho eliminaram Lech Poznan, Liverpool, Dínamo Kiev e Benfica. Depois, na final, jogaram contra o Porto. Qual foi a principal dificuldade que tiveram pelo caminho?

    Leandro Salino: Para te dizer a verdade, foi a imprensa portuguesa, porque nem eles acreditavam que podíamos eliminar essas equipas. Quando nos calhou o Liverpool, toda a gente achava que íamos perder. Quando foi com o Benfica, já havia cartazes da final “Benfica X Porto”. Acho que também ninguém imaginava que íamos eliminar o Benfica. Nós tínhamos um psicológico muito bom e sabíamos das capacidades da equipa que tínhamos. A imprensa toda a dizer que a final ia dar Porto X Benfica, acabámos por frustrar as pessoas.

    Bola na Rede: Isso desmotivava-vos ou dava-vos mais ânimo?

    Leandro Salino: Motivava-nos demais! Eles esqueciam-se de falar no Braga. Todos queriam uma final entre Benfica e Porto. Isso motivava-nos bastante. Foi um grande jogo contra o Benfica, com um golo do Custódio de cabeça, um grande golo. Quando levámos o Braga à final, a cidade ficou em festa por muito tempo.

    Bola na Rede: Na meia-final, contra o Benfica, perderam a primeira mão. Como é que se motivaram para dar a volta na segunda?

    Leandro Salino: Vou-te dizer, não foi fácil. O Vandinho ficou suspenso, não podia jogar o jogo de volta e acabou por entrar o Custódio que fez o golo de cabeça. A jogarmos em casa éramos muito fortes. Sabíamos que íamos marcar um golo ao Benfica, mas tínhamos a consciência de que não podíamos sofrer. O Benfica, com o Jorge Jesus, era uma equipa muito forte. Foi isso que aconteceu, fizemos golo num canto, um lindo golo, e conseguimos segurar a pressão, que foi enorme, do Benfica no final. Fechámo-nos ali e neutralizámos os pontos fortes do Benfica. O coletivo deles era muito forte com Aimar, Gaitán, Coentrão… uma equipa espetacular.

    Bola na Rede: Como geriram a alegria de chegarem à final?

    Leandro Salino: A cidade ficou em festa. As pessoas abordavam-nos nos shoppings e restaurantes. Foi um feito histórico. Lembro-me de o [António] Salvador estar numa alegria que nem cabia nele. Foi muito importante esse feito para o Braga. Querendo ou não, ficámos na história do clube.

    Bola na Rede: Foste bastante utilizado até à final, mas acabas por não jogar contra o Porto. Ficaste triste?

    Leandro Salino: Foi o momento mais triste da minha carreira. Eu era titular absoluto, tinha feito todos os jogos. O Domingos Paciência tinha uma dúvida, porque o Vandinho fez o golo contra o Benfica lá e o Custódio fez o golo em Braga. Então, ele tinha uma dúvida. O meio-campo titular era sempre eu, o Vandinho e o Hugo Viana. Ele tinha essa dúvida entre o Vandinho e o Custódio. No treino de reconhecimento do campo, um dia antes, ele meteu a equipa titular e eu estava. A meio, ele tirou o Vandinho e colocou o Custódio. Com certeza, o Vandinho não gostou. Fomos jantar, fomos para o hotel. No dia do jogo, pela manhã, acordei, tomei café, normal. Depois do almoço, o Domingos Paciência chama-me a mim, ao Custódio, ao Hugo Viana e ao Vandinho. Não entendi nada. O Domingos Paciência disse que estava com uma dúvida muito grande, deu-nos os parabéns e disse que dos quatro só iam jogar três. “Eu decidi que vou entrar com o Hugo Viana, Vandinho…” e eu achei que ele ia dizer o meu nome e ele disse “Custódio”. Toda a gente ficou a olhar, ninguém entendeu nada. “Decidi entrar com dois médios mais de marcação e vou libertar mais o Hugo Viana para fazer quase de ´10`”. “Vão entrar eles os dois, porque a equipa do Porto é muito forte”. “Se neutralizarmos o meio-campo deles temos muitas hipóteses de ser campeões”. Aí eu disse: “Tem a certeza disso?”. E ele: “Tenho”. Só me levantei e saí da sala. Respeitei, mas o Vandinho, o Custódio e o Hugo Viana também não acreditaram que ele tinha feito aquilo. Não tive cabeça para ficar na sala, nem consegui falar mais. Fiquei muito muito chateado. Para te dizer a verdade, já nem tinha cabeça para o jogo. No balneário, quando ele deu a equipa que ia jogar, ninguém entendeu nada. Alguns jogadores também estavam chateados com a atitude que ele teve. O Vandinho, pela manhã, falou com ele e disse que não aceitava ficar no banco, porque também era titular absoluto. No treino, quando ele tira o Vandinho e mete o Custódio, já criou a dúvida e o Vandinho chamou-o para conversarem. Ele, com medo do Vandinho, respeito, sei lá… decidiu estoirar pelo lado mais fraco. Eu fiquei no banco sem reação nenhuma. Se ele me metesse não ia fazer diferença nenhuma. No final do jogo, quando ele me vem dar os parabéns, nem na cara dele olhei. Foi uma grande sacanagem que ele fez.

    Bola na Rede: Nunca mais falaste com ele?

    Leandro Salino: Ele pediu-me desculpa pelo que fez. Reconheceu o erro dele. Depois, nunca mais falei com ele, mas foi por falta de oportunidade, porque nunca mais nos encontrámos.

    Bola na Rede: Fora isso, como foi a final vista de dentro?

    Leandro Salino: Foi uma festa muito bonita. O Estádio era muito bonito e estava cheio. A cidade de Braga foi toda. A nossa equipa estava muito bem, só que a equipa do Porto também era muito forte. Eles tinham o Moutinho, o Falcão, o Hulk, o Guarín, o James… Na única oportunidade que o Porto teve, fez golo. O jogo estava de igual para igual. Tivemos a oportunidade de empatar nos pés do Mossoró, que teve um cara a cara com o Helton, mas não conseguiu marcar. Era jogo para empate, para ir a prolongamento. Foi um jogo muito disputado, em que as duas equipas se conheciam, mas o Porto foi feliz. Apesar da derrota, o Braga, o Salvador e a cidade ficaram muitos contentes com o nosso desempenho.

    Bola na Rede: Foi o auge da tua carreira?

    Leandro Salino: Foi. Aquele momento ali de chegar a uma final da Liga Europa… Não foi tão assim, porque ele me tirou da final [risos].

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    Francisco Grácio Martins
    Francisco Grácio Martinshttp://www.bolanarede.pt
    Em criança, recreava-se com a bola nos pés. Hoje, escreve sobre quem realmente faz magia com ela. Detém um incessante gosto por ouvir os protagonistas e uma grande curiosidade pelas histórias que contam. É licenciado em Jornalismo e Comunicação pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e frequenta o Mestrado em Jornalismo da Escola Superior de Comunicação Social.