«Frederico Varandas não é líder. Não tem estilo de líder, não tem capacidade de líder, nem tem imagem de líder»
Bola na Rede: Vamos então falar da versão do Augusto Inácio dirigente. Foste apoiante do Bruno de Carvalho desde as eleições de 2011 e assumiste o cargo de diretor geral do Sporting quando o Bruno de Carvalho venceu as eleições em março de 2013. O que encontraste quando regressaste ao Sporting?
Augusto Inácio: Encontrei um clube completamente derrotado, sem ambição, que tinha uma cultura de exigência muito curta. As minhas expectativas eram que fosse possível fazer uma grande reviravolta e dar ao clube a dinâmica que o Sporting precisava. E isso aconteceu. O Bruno de Carvalho foi a pessoa certa. Ele dinamizou o clube de uma forma que, dificilmente, naquela altura, mais alguém poderia conseguir. Só aquela, entre aspas, “maluquice” dele é que permitia acreditar que fosse possível fazê-lo. Mas atenção! A palavra “acreditar” também o Sousa Cintra usa. O Sousa Cintra também diz que “acredita”. Eu “acredito” que vou ser campeão. Uma coisa é “acreditar”, outra coisa é fazer por acreditar. Essa é que é a grande diferença.
Bola na Rede: E o trabalho do Bruno Carvalho permitiu tornar essa crença em realidade?
Augusto Inácio: Exatamente. Se não acreditasse nas ideias do Bruno de Carvalho nunca o teria apoiado. Antes de aceitar o convite do Bruno de Carvalho eu li todo o programa dele.
Bola na Rede: Já o conhecias antes?
Augusto Inácio: Não. Nunca tinha falado com ele na minha vida. Estava a treinar o Moreirense quando ele quis falar comigo pela primeira vez. Encontrámo-nos na Mealhada, a meio do caminho, para ele me explicar quais eram as ideias dele e para me passar para a mão o projeto com 120 pontos. Posso dizer-te que estava de acordo com 118 dos 120 pontos do projeto que o Bruno de Carvalho me apresentou (dois dos pontos eram discutíveis). Eu só lhe perguntei: “– Mas é isso mesmo que você vai fazer?” Diz ele: “– Se não for isto o que eu vou fazer, você pode pode ir para os jornais e ‘rasgar-me’ todo”. As palavras exatas foram estas: “Pode ir para os jornais ‘rasgar-me’ todo”. Bom, eu disse: “– Não o conheço de lado nenhum, mas se você cumprir isto que está aqui estou consigo”. Mas, atenção, nós íamos lutar contra “Godinhos Lopes”, “Carlos Freitas”, “Luis Duques”, os “pesos pesados”. Mas eu não fui para o Sporting por pessoas, fui por projetos. E achava que aquele era o projeto que o Sporting precisava.
O bom filho à casa torna. Bem-vindo de volta, ‘Leão’ @Augusto__Inacio! 🦁 pic.twitter.com/UPqhX6QSvF
— Sporting Clube de Portugal (@Sporting_CP) May 22, 2018
Bola na Rede: O Sporting ganha, de facto, uma nova dinâmica nessa altura. Na primeira época do Bruno de Carvalho acaba o campeonato em 2.º lugar, com o Leonardo Jardim, e na segunda conquista a Taça de Portugal, com o Marco Silva. Mas é também nessa época que começam a surgir os primeiros problemas. O clima que se vivia no Sporting continuava a não ser de paz e houve ali um choque entre o Bruno de Carvalho e o Marco Silva. Como é que explicas esta situação?
Augusto Inácio: Nesse caso, estou completamente de acordo com o Bruno de Carvalho. O Marco Silva foi avisado. Acho que o Marco Silva não foi correto com o Sporting e com o presidente. Acho que ele fez tudo para ser mandado embora. Tudo! O objetivo dele, se calhar, era mesmo esse: ir para outro clube. Acho que sim. E ele acaba a época no Sporting a muito custo, porque foram seguradas muitas “pontas2 apenas para o Sporting não ser considerado um clube que tem três ou quatro treinadores por ano. O Leonardo Jardim teve um ano inteiro. O Marco Silva teve um ano inteiro, mas, sinceramente, Marco Silva não merecia ter estado um ano inteiro no Sporting.
Bola na Rede: Afinal, o que se passou?
Augusto Inácio: Começa logo na pré-época, na Corunha, quando o Sporting vai ao torneio Teresa Herrera. E aí começa a entrar a Doyen, o Marcos Rojo, o Carlos Gonçalves… O empresário do Marco Silva é o Carlos Gonçalves.
Bola na Rede: Sim. Mas estás a dizer-me que estavam a tentar gerir o Sporting de fora para dentro?
Augusto Inácio: Era o que queriam, mas com o Bruno de Carvalho não tiveram hipótese nenhuma. Queriam fazer o que faziam nos anos anteriores, mas ali não entraram. E o Marco Silva estava alinhado com as ideias dos outros, não com as do clube. E nessa altura já esteve “tremido”. E posso dizer-te que segurei muitas “pontas”, muitas mesmos, para que ele chegasse até ao fim. Mas, sinceramente, olhando hoje para a situação, acho que o Bruno de Carvalho é que tinha razão.
Bola na Rede: Então, pelo Bruno de Carvalho, o Marco Silva teria sido despedido ainda antes da final da Taça de Portugal?
Muito antes. No jogo no Nacional da Madeira, o Carlos Mané faz o golo da vitória [1-0], e o Marco Silva vai para o facebook “rasgar” indiretamente o Bruno de Carvalho, o seu próprio presidente. É inadmissível. Depois há uma reunião onde ele não tem a coragem de dizer na cara do Bruno de Carvalho aquilo que ele pensava ou o que queria. E aí começámos a desconfiar que havia, e depois viemos mesmo a confirmar, que havia um clube que andava a sondá-lo para ele ir para lá – mas agora não vale a pena dizer o nome desse clube.
Bola na Rede: Nessa época houve interferências na vida interna do Sporting de empresários e de outro clube?
Augusto Inácio: Exatamente. Só que os adeptos do Sporting muitas vezes não sabem o que se passa e depois tomam partidos, mas, se calhar, se soubessem era ao contrário. Mas, enfim, lá se conseguiu que as coisas fossem até ao fim.
Bola na Rede: E no ano seguinte, com a saída do Marco Silva e a chegada do Jorge Jesus deixas de ser o diretor geral do clube e assumes as relações internacionais. Ficaste com alguma mágoa por teres sido afastado do cargo?
Augusto Inácio: Vamos lá ver… Eu não falava com o Jorge Jesus há vinte e tal anos. Hoje, falo com ele, pois passados dois meses de ele ter chegado ao Sporting tivemos um almoço, onde estive eu, ele e o presidente Bruno de Carvalho.
Bola na Rede: Foi o Bruno de Carvalho que promoveu essa reaproximação?
Augusto Inácio: Não, quer dizer, o Jorge Jesus tinha interesse em falar comigo e eu também tinha interesse em falar com ele. As coisas conjugaram-se e o Bruno de Carvalho organizou o almoço. O almoço correu bem. Acho que em cinco minutos ultrapassámos as divergências todas. Depois estivemos ali mais quatro horas a falar de futebol e do Sporting e ele ainda voltou a convidar-me para almoçar com ele e falarmos de coisas do futebol e, principalmente, do Sporting. Não vou dizer que ficou uma grande amizade, mas ficámos com uma relação de respeito mútua e podemos almoçar ou jantar em qualquer altura. Agora está muita gente do Sporting contra ele, por isto ou por aquilo, mas agora não vou deixar de ser amigo só porque ele não está no Sporting. Não. Se fiz as pazes, fiz as pazes. Acabou. Quando ele ganhou a Taça dos Libertadores enviei-lhe uma mensagem a dar-lhe os parabéns, ele agradeceu-me… Ou seja, ficou uma relação simpática.
Bola na Rede: Mas és afastado do cargo de diretor geral devido a estares de relações cortadas com o Jorge Jesus…
Augusto Inácio: O Bruno de Carvalho tomou a iniciativa de contratar o Jorge Jesus… Se houvesse esse almoço antes da vinda dele para o Sporting, acho, sinceramente, que ainda hoje estaria no Sporting. Mas como aquilo não fazia sentido, estarem a coabitar o treinador e o diretor que não falavam um com o outro… Fui, entre aspas, o “sacrificado”. Fui para as relações internacionais, mas disse logo ao Bruno de Carvalho que aquele cargo não era para mim, que não tinha nada a ver com aquilo que eu entendo ser o futebol. Deixei passar um tempinho, para não fazer muitos estragos, e depois saí de “fininho”, para não fazer tanto ruído.
Bola na Rede: E o Sporting ficou a perder? Achas que a dupla Jorge Jesus-Augusto Inácio poderia ter feito um bom trabalho no clube?
Augusto Inácio: Acho que não cometo nenhuma inconfidência se disser que o Jorge Jesus já me disse que há duas pessoas com quem ele gosta muito de falar de futebol: o Rui Costa, do Benfica, e eu. Falamos a mesma linguagem, não dizemos “Amén” a tudo o que ele diz, damos os nossos argumentos, e ele gosta disso, ele gosta do debate. Acho que podia ter sido uma mais-valia para ele e que poderia também ter contribuído para que algumas coisas menos boas que aconteceram não tivessem acontecido.
Bola na Rede: Estás a falar de Alcochete?
Augusto Inácio: Não, não… Isso são coisas que não passam pela “cabeça do diabo”. Estou a falar de coisas internas, do dia-a-dia. Às vezes há aquelas coisinhas que não passam cá para fora, mas começam a “moer” lá dentro. Se não forem eliminadas, aquilo torna-se uma bola de neve. É aquele que já não olha de frente para o outro, só de lado, e às vezes há alturas em que temos de sanar as coisas no momento certo. Acho que poderia ter sido uma mais-valia, sim, modéstia à parte.
Bola na Rede: Há pouco tempo disseste, numa entrevista, que o Sp. Braga tinha melhor plantel que o Sporting. Com o Sporting a liderar o campeonato, a mostrar bom futebol neste início de época, manténs essa opinião?
Augusto Inácio: Continuo a dizer que o Sp. Braga tem melhor plantel que o Sporting. A grande diferença é que o Sp. Braga está na Liga Europa e o Sporting não está. Ou seja, o Sp. Braga tem um desgaste maior, os seus jogadores têm lesões mais rápidas. O facto de o Sporting ter ficado fora da Europa permite ao Ruben Amorim treinar a equipa semana a semana e, se tiver um jogador com um toque, algum pormenorzinho, pode recuperar em dois ou três dias. Se estivesse na Liga Europa, se calhar, tinha de falhar esse jogo e depois logo se via se podia jogar no campeonato… O Sporting tem, neste momento, a capacidade de poder ter jogadores mais frescos que o Sp. Braga. Mas, sinceramente, acho que o Sporting está fazer um excelente campeonato. O Ruben Amorim está a fazer um excelente trabalho. Vê-se que a equipa está unida, coesa, os jogadores dão o “sangue” uns pelos outros, o que é um dado extremamente positivo. Mas continuo na minha: se o Sporting perder ali dois ou três jogadores nucleares, vai ter muitas dificuldades, não que perca a vontade de ganhar, mas fica com menos argumentos para conseguir ganhar. E acho que se o Sporting não for buscar dois ou três jogadores no mercado de inverno vai ter muitas dificuldades.
Bola na Rede: Pelo que já viste neste início de época quem é, para ti, o principal candidato ao título?
Augusto Inácio: Eu tento fazer uma análise ao ano todo. Se fosse só por este momento, diria o Sporting. Não vejo ninguém a jogar melhor que o Sporting. E mesmo assim mais próximo até está primeiro o Sp. Braga do que o Benfica ou o FC Porto. Mas o campeonato é até maio. Lá no fundo, tenho uma réstia de esperança que o Sporting pode lá chegar… mas, sinceramente, os mais favoritos, para mim, são Benfica e FC Porto ou FC Porto e Benfica, como queiram…
Bola na Rede: O Frederico Varandas falou de dificuldades acrescidas face aos rivais numa das suas últimas intervenções públicas. “Este golo jamais seria anulado aos nossos rivais, mas seriam quatro pontos de avanço e começaram a tremer”, disse o presidente do Sporting no final do jogo em Famalicão, após a anulação do golo a Sebastien Coates no último lance da partida. Subscreve estas palavras?
Augusto Inácio: Eu lamento dizer isto, mas o presidente do Sporting, às vezes, fala nos momentos em que não deve falar. Uma coisa é proteger a equipa e falar no momento certo. E depois é a forma como se dizem as coisas. Temos de ser coerentes e frios nas análises. Acho que ele faz uma análise, com certeza, segundo o que lhe contaram. Eu já fiz a análise desse jogo. O Sporting foi muito prejudicado pela arbitragem, mas não pelo golo anulado, que foi bem anulado. O Coates fez falta. Agora, no critério disciplinar, o Pedro Gonçalves foi mal expulso. Nunca deveria ter levado o primeiro amarelo. Depois, leva o segundo por chutar a bola, mas não nos podemos esquecer que o Gustavo Assunção fez a mesma coisa e foi apenas advertido. E depois as pequenas faltas, nota-se quando se tenta que uma equipa não vá para a frente. Não é precisar marcar penáltis para prejudicar uma equipa. Acho que o Sporting tem muitas razões de queixa, mas o presidente do Sporting se quiser defender a sua “dama” – e não é aquilo do golo do Coates, ele não pode defender uma coisa daquelas, porque é falta e ponto –, também não nos podemos esquecer que o Sporting na jornada anterior marcou o golo do empate [pelo Pedro Gonçalves] na receção o Moreirense num lance que deixa muitas dúvidas. Não vou dizer que foi mão ou não, mas deixa muitas dúvidas. E depois é a forma como comunica, falando dos rivais. Para defender o Sporting não é preciso falar dos rivais. Estamos sempre a passar uma imagem de complexo de inferioridade. Temos é de falar do Sporting e do jogo que, neste caso, foi com o Famalicão.
Bola na Rede: Frederico Varandas tem estado mais ativo. Achas que Frederico Varandas está, hoje, mais perto do registo combativo que caracterizou a presidência do Bruno de Carvalho?
Augusto Inácio: Para já, não tem capacidade nenhuma. O Frederico Varandas não chega “a um dedo” daquilo que é o Bruno de Carvalho nesse sentido. Está a quilómetros de distância. Este presidente do Sporting, em comunicação, desculpem a expressão, é zero. Zero! Comunica mal, não sabe ser contundente no que tem de dizer. Agora, como as pessoas começaram a dizer que o Ruben Amorim é que é o comunicador, o Ruben Amorim é que é o líder, o Ruben Amorim é que é a voz do Sporting, o Ruben Amorim é que é o único que fala, o Frederico Varandas, nestes momentos, em que sente que foi prejudicado, pensa: “Eu é que sou o líder, eu é que tenho de falar”. Porque ele pensa que se não falar os sportinguistas vão dizer: “O que é que este presidente banana está aqui a fazer que não fala?”. Ele não fala quando deve falar, ele fala para que as pessoas digam: “– Ah, ele também está ali a defender o Sporting. Estás ver como ele anda a falar”. Acho que as coisas não são assim que se fazem. As pessoas ou são líderes ou não são líderes. E eu, sinceramente, tenho de dizer aquilo que sinto: Frederico Varandas não é líder. Não tem estilo de líder, não tem capacidade de líder, nem tem imagem de líder. Não é líder! Ele pode falar, pode dizer o que quiser, mas acho que ninguém o ouve. Mas se for o Ruben Amorim a falar já o ouvem. Só para se ver a diferença.
Bola na Rede: Mas o que achas que falta ao Frederico Varandas?
Augusto Inácio: Falta ao Frederico Varandas falar daquilo que ele disse que ia falar, do campeonato de 2015/2016. Porque ele disse que sabia porque é que o Sporting tinha perdido esse campeonato. Falta ao Frederico Varandas falar desse campeonato, que é do Sporting, que foi roubado ao Sporting e que não é do Benfica. O que falta ao Frederico Varandas é liderança e carisma, isso é coisa que ele não tem.