Ainda ontem, no dia 2 de Julho de 2015, revi pela 128ª vez todas as imagens respeitantes às exéquias fúnebres de Eusébio da Silva Ferreira. Sempre com um olhar carregado, como que não acreditando ainda que esta lenda nos abandonou, muito nostálgico. Dir-me-ão que fico assim porque sou benfiquista da cabeça aos pés e eu responderei que talvez isso tenha muita influência, mas mesmo que fosse adepto de um outro clube…penso que admiraria sempre o Pantera Negra. Escrevo este artigo ainda antes da cerimónia de trasladação ter início, por isso não descreverei nada daquilo que se irá passar.
Quando se deu a trasladação dos restos mortais de Amália Rodrigues para o Panteão Nacional, no dia 8 de Julho de 2001, eu virei-me para o meu pai e soltei um “tenho a certeza de que com o Eusébio vai acontecer o mesmo”, apesar da minha ainda prematura idade. E tal como eu previ há quase catorze anos, isso vai mesmo acontecer. E como podia não acontecer? Estamos a falar de um homem que fez com que fosse possível um norte-americano conhecer Portugal, estamos a falar de um homem que prendeu milhões de portugueses ao transístor, estamos a falar de um homem que reúne consensos na sociedade portuguesa como quase ninguém conseguiu até hoje. Futebol não é cultura? Será indecente tratar Eusébio como se trataram (ou não se trataram) escritores, grandes nomes da música e do cinema? Não, não é indecente. Eusébio é e sempre será um símbolo deste país à beira-mar plantado, Eusébio foi um homem amado e venerado em complicados tempos ditatoriais, Eusébio era visto pelo povo com um dos seus, um homem que a pulso singrou na vida e que com a sua humildade continuou a manter exactamente as mesmas rotinas.
O Benfica e a bola: os dois amores do King Fonte: terceirotempo.bol.uol.com.br
Sinto-me um adepto abençoado. Felizmente foi no Sport Lisboa e Benfica que o Pantera Negra fez carreira, não há ninguém maior do que ele na história do clube, falar-se do Benfica é falar-se de Eusébio. Tal como escrevi no ano passado, a morte de Eusébio provocou momentos arrepiantes em grandes palcos como o Santiago Bernabéu e Old Trafford, foi motivo de notícia em todo o mundo, colocou em suspenso toda uma cidade de Lisboa debaixo de um temporal impiedoso. Os céus revoltaram-se contra a morte ainda prematura de uma lenda, de um dos grandes ícones do século XX português, um dos últimos heróis do povo a abandonar-nos. Impossível Eusébio da Silva Ferreira não merecer todo este aparato, todas estas cerimónias, é o mínimo que se pode fazer por alguém que catapultou Portugal para além do miserabilismo latente que por cá vigorava, dalguém que fez parar por milhentas vezes uma nação adormecida.
Tenho 26 anos, mas mal comecei a ver futebol vi em Eusébio uma referência. Sempre vi vídeos seus, sempre comprei cassetes e dvd’s referentes a este monstro sagrado do futebol mundial, sempre que o via a falar na tv parava, como que em sinal de continência. No dia em que ele morreu petrifiquei, não saí do sofá, fiquei incrédulo. No dia seguinte não pensei em mais nada, só quis estar presente no Estádio da Luz e no funeral. Debaixo de uma chuva incessante, vendo ali milhares de pessoas não se importando com isso, eu voltei a constatar o quanto Eusébio da Silva Ferreira era respeitado no nosso país. Voltaria a fazer tudo de novo, de uma forma quase estúpida não me perdoo por nunca tê-lo visto jogar, mas todo o legado que ele deixou foi mais do que suficiente para me apaixonar pela sua história de vida.
Hoje é um dia especial. Hoje é mais um dia de Eusébio da Silva Ferreira. Os seus restos mortais irão para o Panteão Nacional, casa dos deuses, dos nunca esquecidos. Do Panteão para todo o país, para todo o mundo, tal como só os heróis o conseguem. Não irei alongar-me muito mais, tal como já disse esta sexta-feira é do homem que saltou de Mafalala para o resto do planeta, mas sempre que escrevo sobre ele vêm-me à cabeça imagens sem fim.
A morte de Eusébio parou o país Fonte: Facebook Oficial Museu Cosme Damião
Aquele momento, após o Inglaterra 2-1 Portugal das meias-finais do Mundial 66, em que Eusébio da Silva Ferreira chorou de uma forma compulsiva depois da eliminação da selecção portuguesa acompanha-me desde que me lembro de mim próprio. Lágrimas de tristeza, lágrimas derramadas há 49 anos atrás, lágrimas que se perpetuaram no tempo e que hoje são comungadas por mim e por uma imensidão de gente.
Obrigado, Eusébio. Obrigado por me fazeres sentir que falarei sobre ti exactamente da mesma forma até ao fim dos meus dias. Obrigado pelos teus préstimos ao Sport Lisboa e Benfica e a Portugal. Obrigado por seres um dos meus ídolos. Enfim, obrigado por tudo. Um ser humano só pode agradecer por teres feito parte deste mundo.
Durante longos anos de uma ditadura cinzenta e opressiva, Portugal viveu sob o espectro dos três “f”: Fátima, Família e Futebol, sendo que antes do “f” de Futebol surgia o “e” de Eusébio, a maior lenda do desporto rei nacional antes do aparecimento mais ao menos recente de Cristiano Ronaldo.
É inegável reconhecer a importância do “Pantera Negra”, futebolista que fica umbilicalmente ligado ao período mais vitorioso da história do Benfica, mas também à primeira e até agora melhor participação de Portugal num Campeonato do Mundo, quando foram os seus 16 golos (sete na qualificação e nove na fase final) a contribuírem de sobremaneira para um brilhante terceiro lugar no Inglaterra 66.
Os números, aliás, não deixam qualquer margem para dúvidas do impacto que teve Eusébio no futebol nacional, tanto pelos 476 golos em 440 golos pelo Benfica, como pelos 41 golos em 64 jogos pela “Equipa das Quinas”. E se antes do “Pantera Negra” já Fernando Peyroteo se tinha assumido como um grande goleador luso e até com melhor média de tentos, a verdade é que Eusébio surge numa fase em que a mediatização do futebol já era muito maior, sendo ele a primeira grande figura de exportação nacional.
Eusébio destacou-se no Benfica Fonte:architectninja.com
Afinal, durante um longo período em que a imagem de Portugal no Mundo alternava entre o apagamento e a (má) crítica, Eusébio foi uma espécie de farol de positivismo, funcionando como o nosso melhor embaixador no planeta, ou não trouxessea melhor notoriedade possível para um pequeno e algemado país. Essa boa imagem, aliás, arrasta-se até aos dias de hoje, mesmo depois da sua morte, com o nome e o impacto do antigo atacante a continuar a confundir-se com o próprio Portugal.
E se naturalmente Eusébio não foi o única personalidade a contribuir para essa melhor imagem de Portugal no estrangeiro, é inegável que esta sua iminente trasladação para o Panteão Nacional acaba por traduzir-se nesse merecidíssimo reconhecimento.
É que o impacto e simbolismo à volta deste génio de Lourenço Marques irá estar sempre muito para além dos golos, grandes exibições e títulos que ajudou a trazer para o Benfica e para a selecção nacional, e centrar-se-á igualmente na talcontribuição para uma melhorimagem de Portugal no Mundo, algo queperdura até hoje e certamente continuará a perdurar por muito mais tempo. Issonão tem preço e, na minha opinião, nem deveria permitir que se questionasse sequer a sua presença no Panteão Nacional. Se outros também mereciam lá estar? Obviamente que sim, mas como costumam dizer os ingleses: “Two wrongs don’t make a right”.
Ao longo da infância, a televisão, os livros, o cinema e a música trazem ao nosso olhar figuras que marcam a nossa vida. Seja aquela banda pela qual nós despendemos uma fortuna apenas por causa de um concerto, seja por aquele ator que tanto queríamos conhecer e pelo qual esperamos horas, enquanto crianças, em filas intermináveis de lojas apenas por um autógrafo.
Assim é feita a vida de todos os que se deparam com um mundo cada vez mais mediatizado, feito de figuras que vemos e adoramos, mesmo que apenas as conheçamos da tela do cinema, das linhas do livro ou do som de um álbum. Para as pessoas da minha geração, falar por isso de heróis é algo tão comum que já nem sequer nos lembramos – até porque não vivíamos nesse tempo – dos momentos em que esses mesmos heróis não apareciam da mesma forma para o mundo. Ouvimos falar deles apenas nos testemunhos dos nossos pais ou avós, que passam o tempo a contar-nos que “naquele tempo é que era”. E esta é uma expressão que serve para tudo no quotidiano: se achamos que Messi e Ronaldo são os melhores jogadores de sempre, são eles que nos dizem que “naquele seu tempo, em que jogavam Pelé ou Maradona, aí é que era”. Peguei apenas no exemplo de jogadores de futebol mas tantos outros podiam ser dados.
Por tudo isto que vos disse, admito que não é fácil escrever este texto. Afinal de contas, não é fácil falar ou escrever sobre algo ou alguém que não vimos. Não é fácil entrar numa discussão ou sequer poder exprimir em palavras a devoção ou a gratidão que possamos ter por uma figura que tenha marcado os tempos que ainda não eram os meus. Por isso, não é fácil para mim falar de Eusébio da Silva Ferreira. É, porventura, a par de Maradona, o jogador que sempre me criou uma desilusão enorme por nunca ter conseguido perceber se, como me dizia o meu avô, “naquele tempo é que era”. Entre todas as conversas de jardim, fui crescendo a ouvir as histórias e os relatos daquele que seria para sempre a figura maior do desporto português. Uma figura que, a 25 de janeiro de 1942, nascia para o mundo em Lourenço Marques, Moçambique. Naquela altura, num período de ditadura fascista e de controlo colonial, Moçambique era apenas um ponto entre tantos no continente africano. Por isso, naquele dia de janeiro, ninguém adivinharia que, nos braços de Elisa Anissabeni, a mãe de Eusébio, estaria um dos homens que marcaria para sempre a história de Portugal.
Mais de setenta anos passados, olhar para a história de Eusébio é um exercício que serve de exemplo para muitos daqueles que constantemente perseguem os seus sonhos. O bairro de Mafalala foi apenas o ponto de partida para o sonho do Pantera Negra. Por entre os campos de terra e as bolas de couro com que, descalços, os meninos brincavam nas ruas moçambicanos, despontava o jeito de Eusébio, com a sua técnica inconfundível, fruto de um pé direito que desde cedo começava a fazer maravilhas. A primeira paragem foi numa equipa moçambicana denominada por “Os Brasileiros”. Por se chamar assim, os seus jogadores tinham alcunhas correspondentes a jogadores “canarinhos” desse tempo, como Garrincha e Didi. A de Eusébio era, curiosamente, Pelé. Não terá sido, com toda a certeza, por acaso que tal nome foi-lhe colocado. A sua velocidade, aliada a uma qualidade ímpar para alguém com tão pouca idade, fazia de Eusébio um projeto de jogador que podia ter o mundo a seus pés.
Eusébio foi a figura maior do Benfica Fonte: serbenfiquista.com
Apesar de ser benfiquista desde pequeno, a verdade é que, na passagem pela filial encarnada, o Desportivo de Lourenço Marques, Eusébio não foi bem recebido. Decidiu dar um novo rumo ao seu percurso e o próximo destino acabaria por ser o Sporting de Lourenço Marques. Dali até Alvalade, foi apenas um instante. Rapidamente os responsáveis leoninos viram que aquele era um menino que não podiam deixar fugir. Decidiram convidá-lo para treinar à experiência mas a verdade é que esse foi o primeiro momento em que o seu coração falou mais alto. Recusou o convite sportinguista e acabou por assinar contrato com o Benfica que, ao ver o interesse rival, ofereceu-lhe uma proposta que Eusébio acabou por aceitar. A 15 de dezembro de 1960, o Benfica colocou Eusébio num avião sob um nome falso (Ruth Malosso) e avisou os leões de que o jogador tinha partido para Lisboa de barco. O Sporting não desistiu, decidiu duplicar a oferta do Benfica, pagando na altura 250 contas â mãe de Eusébio. A verdade é que o Benfica acabou por esconder o rapaz de 18 anos num hotel em Lagos, evitando que ele fosse resgatado pelo rival de Alvalade. Naquele momento, e apesar do longo processo burocrático com os dois rivais, a verdade é que a assinatura de Eusébio era o compromisso para o início de uma história jamais esquecida pela nação benfiquista.
Na altura, dezoito anos de vida já pareciam uma eternidade para Eusébio. Entrava na idade adulta e o conflito que havia “gerado” entre os maiores clubes nacionais da altura já fazia dele uma figura incontornável do futebol português. Dentro de campo, rapidamente se percebeu o porquê de toda aquela disputa por Eusébio. Mesmo num plantel em que despoletavam nomes como José Augusto, José Águas e Mário Coluna, a verdade é que já ninguém ficava indiferente ao talento do jovem moçambicano. A estreia no Estádio da Luz remonta a 23 de maio de 1961, onde, numa partida com o Atlético, Eusébio fazia três dos quatro golos do Benfica. As peripécias que se sucederam desde a sua chegada atrasaram a assinatura do contrato, e a chegada “tardia” de Eusébio à equipa do Benfica fez com que tenha perdido a primeira das duas conquistas da Taça dos Clubes Campeões Europeus, em 1961, em Berna, na vitória dos encarnados por 3-2 contra o FC Barcelona. Por falar em conquistas europeias, apenas um ano depois o Benfica voltava a tocar o céu do futebol europeu e, numa memorável vitória por 5-2 frente ao Real Madrid, destacava-se um nome: Eusébio. Com dois golos apontados naquela noite perante o colosso espanhol – que contava com Puskas e Di Stéfano, dois dos maiores jogadores da história madrilena – o menino nascido no Bairro da Mafalala começava a mostrar ao mundo do futebol todo o seu potencial, fazendo com que a célebre revista France Football lhe tenha mesmo atribuído, em 1962, o segundo lugar na Bola d´Ouro.
O Pantera Negra recebeu a Bola de Ouro em 1962 Fonte: francefootball.fr
Falar do percurso de Eusébio é falar de vitórias. Não há volta a dar: ao serviço do Benfica e da seleção nacional, a velocidade estonteante e o potente remate faziam do número 10 benfiquista o ídolo maior de todos os portugueses. A nível coletivo, para além da vitória em 1962, destaque para os onze campeonatos e as cinco taças de Portugal ganhas ao serviço do Benfica. A nível individual, basta apenas passar os olhos por todas as distinções para saber quem era Eusébio da Silva Ferreira: foi eleito melhor jogador do mundo em 1965, vencedor de duas “Botas de Ouro” em 1968 e 1973; melhor goleador do campeonato português em sete ocasiões e duas vezes melhor marcador europeu. No verão de 1966, liderando a célebre seleção dos “magriços”, Eusébio ficaria na história da seleção nacional como a principal figura da equipa que conseguiu a melhor participação de sempre em campeonatos do mundo. Na memória de todos ficaram os dois golos que marcou na vitória por 3-1 sobre o Brasil, os quatro golos apontados na vitória por 5-3 contra a Coreia do Norte nos quartos-de-final ou as lágrimas com que deixou o relvado depois da derrota nas meias finais frente à equipa inglesa.
E por falar em números, aquilo que indiscutivelmente mais se destaca são o número quase absurdo de golos que apontou. No total, foram 546 os golos que marcou pela seleção portuguesa e ao serviço dos clubes por que passou. Pelo Benfica, foram 473 golos em 440 jogos oficiais. Mas com os golos, veio também o calvário de alguém que foi vítima da falta de proteção que jogadores do seu talento tinham na altura. A sua carreira andou entre a glória e a dor, com seis operações ao joelho esquerdo e uma ao joelho direito. Impedido por ordem de Salazar de aceitar os inúmeros convites que lhe chegavam de Espanha e Itália, só depois de terminada a ditadura é que Eusébio saiu de Portugal, passando pelos Estados Unidos (Boston Minutemen, Las Vegas Quicksilvers e New Jersey Americans), Canadá (Toronto Blizzard) e México (Monterrey), com dois regressos pelo meio para representar Beira Mar e União de Tomar. Esta última passagem foi apenas uma breve experiência que durou até Março de 1978, após o qual regressou ao EUA.
Em muitos dos casos, os números são algo demasiado curto para se perceber a importância de alguém. Isso indiscutivelmente acontece no caso de Eusébio. Por muitos golos, assistências e vitórias que tenha dado ao Benfica e à seleção portuguesa, a verdade é que Eusébio da Silva Ferreira sempre foi muito mais do que simples recordes no futebol. Por isso é que, depois de terminar a carreira, ele viu ser-lhe reconhecido o talento. E não podia ser de outra forma, pois foi reconhecido pelo seu Benfica, o clube que lhe deu a maior oportunidade da sua vida e o clube onde teve os melhores momentos da sua carreira. A estátua, em frente ao Estádio da Luz, é apenas o símbolo maior com que nos deparamos quando chegamos à casa benfiquista. Ali, naquela figura, Eusébio é retratado como se estivesse em campo, pronto para fazer mais um dos seus remates lendários e que tantos sorrisos deram aos portugueses no século XX.
Eusébio foi figura de destaque no Mundial 1966 Fonte: imortaisdofutebol.com
Esse é, por ventura, o maior dos créditos que pode ser dado a Eusébio. Hoje em dia, num mundo tão mediatizado, falar-se da importância de um jogador de futebol numa sociedade é sempre relativo. Na altura de Eusébio, a história era completamente diferente. Num país oprimido por uma ditadura retrógrada, Eusébio da Silva Ferreira era a figura que fazia os portugueses sonharem. No meio dos remates, dos golos, das vitórias e das alegrias que deu ao país, Eusébio era o menino que fazia um povo acreditar que era possível ter um futuro melhor. Mesmo que por breves momentos, o futebol de Eusébio ficou, nas décadas de sessenta e setenta, como uma marca que o tempo jamais conseguirá retirar da história.
Como vos disse no início do texto, é-me difícil falar do que foi Eusébio. Não o vi jogar e não presenciei os momentos em que Eusébio mostrou o porquê de ter sido considerado pela FIFA como um dos melhores da história do futebol mundial. Ainda assim, não posso deixar de perceber, quase um ano e meio depois da sua morte, que a saudade seja enorme pela seu desaparecimento. Naquela manhã de 5 de janeiro de 2014, fui deparado com a notícia da morte de Eusébio. Vítima de paragem cardiorrespiratória, aquela noite havia sido a última da vida do Pantera Negra. Aquilo que deveria ser um domingo como outro qualquer, estava agora marcado por uma das notícias mais tristes que os amantes do futebol poderiam receber.
A partir daquele dia, algo faltou no Benfica e no país. Por ventura, para todos aqueles que não gostam tanto de futebol, ler estas linhas será quase uma heresia. No entanto, tudo aquilo que se seguiu à triste notícia terá sido o exemplo maior daquilo que era Eusébio. As alegrias que havia dado aos adeptos em vida davam agora lugar às lágrimas. Em pleno relvado do Estádio da Luz, foram milhares os que quiseram dizer um último adeus a Eusébio da Silva Ferreira. Durante dois dias, o país parou para perceber que algo de muito importante se tinha perdido. Era Eusébio, aquele menino vindo do Bairro de Mafalala e que agora seria apenas uma recordação. Desde a igreja até ao cemitério do Lumiar, ouviram-se buzinas e aplausos na despedida ao ídolo. A chuva não demovia ninguém e vários eram os milhares que seguiam junto ao carro fúnebre, para partilharem um último momento com uma das maiores figuras de sempre de Portugal. Mesmo que coberta com a bandeira do Benfica, a verdade é que a morte de Eusébio não foi apenas a morte de alguém do Benfica. A morte de Eusébio foi a morte de alguém que marcou para sempre o país e cujo talento quebrou toda e qualquer barreira clubística. Por isso, não foi de estranhar os inúmeros cachecóis e adeptos de equipas rivais que partilharam o momento e a dor com todos os que choravam pela morte de Eusébio.
A despedida a Eusébio juntou milhares no Estádio da Luz Fonte: globoesporte.globo.com
Foram milhares aqueles que se aglomeram junto ao Estádio da Luz, numa primeira fase, e depois no cemitério à espera da chegada da urna. Junto à campa onde foi sepultado, os gritos de apoio ao Pantera Negra ecoaram pelo país e pelo mundo. Os aplausos foram uma constante e, por entre flores e bandeiras, a recordação de uma vida de vitórias e conquistas foi feita por todos aqueles que foram marcadas pelo talento de Eusébio da Silva Ferreira.
Enquanto adepto de um clube rival, não tive, com toda a certeza, o mesmo sentimento que todos os benfiquistas tiveram. Obviamente que não senti da mesma forma o momento em que o hino encarnado foi tocado no relvado da Luz, com milhares de adeptos de frente perante Eusébio. Ainda assim, e tal como escrevi ao longo destas linhas, o facto de Eusébio ser apenas uma memória para mim, isso não invalida que o adeus ao Pantera Negra não tenha sido um momento que para sempre guardarei na minha memória. E é por isso que Eusébio chega ao lugar onde os maiores da história portuguesa estão: ao Panteão Nacional. Será aí a sua última morada e será o ponto de chegada de um percurso marcado pelos sonhos, pelas vitórias, pelas alegrias e pelas tristezas que marcaram a vida de um homem que foi maior do que tudo em Portugal. E, para perceber isso, bastou ver o adeus a Eusébio para entender que, tal como dizia o meu avô, de facto, “naquele tempo é que era”. E sim, porque como Eusébio nunca haverá igual. E é por isso que a sua memória jamais será esquecida. Porque os heróis nunca desaparecem. Até sempre, Rei!
El Comandante. Alcunha que qualquer adepto de futebol português que se preze e que tenha estado atento ao panorama nacional nos últimos anos, reconhece desde logo. Refiro-me, então, a Luís Óscar González, conhecido no mundo do desporto-rei como Lucho González, um dos expoentes máximos do domínio do FC Porto em Portugal em anos recentes (conta seis campeonatos ao serviço dos azuis e brancos) e um centro-campista cuja classe com bola nos pés, aliada a uma inteligência tática e liderança dentro e fora das quatro linhas de elevado nível, o podia ter feito voar bem mais alto na sua carreira.
Argentino formado no Huracán, foi no River Plate (clube com o qual venceu dois Torneios Clausura) que mostrou a sua qualidade técnica e tática ao mundo, o que lhe valeu passaporte para a Europa do futebol, assinando pelo FC Porto em 2005. Tornou-se, desde logo, referência no meio-campo portista e com o passar dos anos virou herói e ídolo dos adeptos.
Lucho não era, no entanto, um 8 ou 10 puro, as suas características permitiam-lhe jogar em ambas as posições, sendo que El Comandante não fez da elevada qualidade de passe a única arma do seu arsenal, pois a capacidade de finalização do argentino também se superou muitas vezes. Foram vários os golos que deu a marcar aos seus colegas de equipa, mas também os tentos que protagonizou. Com enorme capacidade de chegada ao último terço do terreno sempre que possível, nos seus anos de glória estava constantemente presente em jogo, mostrando elevada disponibilidade quer para receber ou entregar a bola aos seus companheiros. Um médio que pautava o ritmo do jogo a seu bel-prazer e que não falhava nos momentos das decisões.
Após quatro épocas de alta rodagem com o símbolo azul e branco ao peito, nas quais contou 111 partidas e 32 golos (excelente índice para um médio!), rumou aos franceses do Marselha, transferência que valeu 24 milhões de euros na totalidade. Negócio que surpreendeu tendo em conta que Lucho já tinha sido associado ao interesse de emblemas com maior projeção internacional (de recordar, Real Madrid e Valência, entre outros) e também pelo facto de que o nível exibido pelo argentino no campeonato português lhe afigurava um destino com uma maior projeção. Certamente que o futebol de El Comandante merecia bem mais. Ainda assim, Lucho protagonizou três temporadas a bom nível no clube francês, no qual celebrou uma Ligue 1, três Taças da Liga francesas e duas Supertaças, sendo ainda o jogador que contabilizou mais assistências (12) no campeonato gaulês em 2009/10.
Lucho assinou contrato com o River Plate
No mercado de inverno de 2011/12 voltou a surpreender, ao aceitar reduzir o salário para regressar ao clube que esteve sempre no seu «coração», o FC Porto, e foi, sem dúvida alguma, peça-chave para a conquista de um campeonato que parecia distante para os azuis e brancos. Na segunda passagem por terras lusas, o pesar da idade já era algo com considerável notabilidade nas exibições do argentino, que, não obstante, esteve em grande plano e foi de importância capital para a equipa, tendo em conta a elevada influência que tem dentro de um plantel, pela tremenda capacidade de liderança que sempre demonstrou, o que o fez ser um dos capitães mais carismáticos da história do FC Porto. Em 2014, os milhões do Catar falaram mais alto e rumou ao Al-Rayyan.
Lucho nunca foi daqueles jogadores que se notabilizassem por fintar meia equipa adversária, mas sim pela capacidade de trabalho, de circulação de bola, liderança e cultura tática dentro e fora das quatro linhas. Salta à vista um episódio protagonizado em 2012/13, aquando de um Dínamo Zagreb-FC Porto, em partida a contar para a fase de grupos da Liga dos Campeões, sendo que horas antes do encontro iniciar El Comandante recebeu a notícia de que o pai havia falecido na Argentina. Ainda assim, jogou e ainda fez o gosto ao pé na partida, assinando uma excelente exibição. É por situações deste tipo que, quer se seja benfiquista, portista ou sportinguista, Lucho González é daqueles jogadores que é admirado por qualquer adepto de futebol e é, certamente, uma das figuras mais incontornáveis que passaram pelos nossos relvados.
Aos 34 anos, Lucho González (que conta ainda 44 internacionalizações pela seleção argentina e uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de 2004) prepara-se agora para abraçar um novo desafio na carreira, um aliciante regresso ao River Plate, clube que o catapultou para a ribalta do futebol europeu, juntando-se aos compatriotas Pablo Aimar e Javier Saviola, que também protagonizaram maravilhas pelos relvados portugueses. O argentino está ainda bem a tempo de voltar a exibir o seu futebol e o campeonato argentino pode ser a montra necessária para encantar os aficionados sul-americanos. Um regresso a “casa” que se saúda, o de El Comandante!
O Sporting foi o principal fornecedor da selecção sub-21 que acabou de se sagrar vice-campeã europeia em Praga. Honrando assim uma já longa tradição de um dos principais fornecedor de jogadores para todos os escalões etários das diversas equipas das quinas, o Sporting tem novamente à disposição uma geração com valor suficiente para continuar a manter esse estatuto na principal selecção, mesmo que, alguns deles, possam já não vestir de verde e branco quando tal suceder.
Tendo o torneio terminado sem o tão almejado título principal a selecção regressou a casa com o sabor amargo de praticamente só não ter liderado a classificação final, uma vez que, quer nos destaques individuais quer nas estatísticas que documentam os comportamentos coletivos, o primeiro lugar foi quase sempre seu. O facto de todos os jogadores do Sporting terem acumulado minutos de jogo no torneio diz bem que a sua relevância não se ficou apenas pela soma aritmética mas também pelo que a sua qualidade individual ofereceu à equipa.
De uma forma sucinta analisarei de seguida a participação de cada um, procurando também perspectivar que tipo de contributo poderão dar no futuro ao clube.
Ricardo Esgaio
Confesso com pena que a sua participação me desiludiu. Esgaio não esteve mal a defender mas foi muitas vezes inconsequente a atacar, definindo quase sempre mal e sem convicção. Pareceu quase sempre pouco à vontade e retraído. É claramente um jogador prejudicado pela falta de desafios mais exigentes que marcaram os últimos anos da sua carreira. Não me parece à altura, neste momento, de uma equipa que tem que lutar pelo titulo de campeão, parecendo-me que melhor seria sair para continuar a jogar.
Paulo Oliveira
Um dos melhores jogadores da selecção. Excelente leitura de jogo, o que lhe conferiu um poder de antecipar as jogadas, estando sempre ou quase sempre no sitio certo antes dos adversários. Dessa forma contrariou a menor velocidade que, associada às dificuldades em sair a jogar, são óbice a ser considerado um indiscutível. Mas é um nome a contar, não surpreendendo de todo que possa manter o estatuto de titular entretanto conquistado.
Tobias Figueiredo
Foi chamado de emergência, por lesão de Ilori e quer no que restou desse jogo quer do que realizou na totalidade cumpriu com distinção. Não parece que venha a ser a primeira escolha de JJ , precisa de continuar a jogar no próximo ano porque ainda denota alguma precipitação, talvez por imaturidade. Se ela é natural na idade, parece também ser-lhe intrínseca. Tem no entanto condições físicas para ser um grande central sendo determinante o que lhe vai ser proporcionado nos anos imediatos.
João Mário
Um jogador com um enorme potencial mas que, por vezes, parece ficar aquém, muito aquém, do que esse potencial deixa advinhar. Fez no entanto um bom campeonato, foi dos melhores, mas alternou bons momentos com outros de largo eclipse, sendo o jogo de ontem um dos melhores exemplos, agravado pelo cansaço que se foi instalando. Muito dotado tecnicamente, o que lhe confere grande qualidade na recepção e no passe, precisa de aumentar quer a agressividade nas tarefas defensivas quer o grau de frieza no momento de finalizar. Quando, e se, o conseguir, será um jogador notável. É dos que auguro poder vir a crescer mais sob a batuta de JJ.
William Carvalho foi eleito o melhor jogador do Euro’2015 Fonte: Facebook ‘Seleções de Portugal’
William Carvalho
Não foi por acaso que foi considerado o melhor jogador do torneio pela UEFA. A diferença para a generalidade dos demais foi muitos vezes abissal, sobretudo ao nível da segurança de execução, compreensão do jogo, qualidade técnica e visão. Mas, apesar de todos os elogios, inteiramente merecidos, não é ainda um jogador “fechado”. Sobretudo quando a equipa entra em transição defensiva William revela ora pouca agressividade, ora pouco acerto na ocupação dos espaços ou na contenção. Isso ontem foi ainda mais evidente após a intrigante decisão de Rui Jorge de Sérgio Oliveira, com quem articulou muito bem. Dificilmente JJ não o transformará no “monstro” que já deixa adivinhar.
Carlos Mané
Jogou pouco, o que se compreende pelas muitas opções que Rui Jorge tinha à disposição. Neste momento não é melhor que Cavaleiro em termos globais, mas tem tudo para o suplantar a breve trecho. Podia ter sido uma alternativa válida por exemplo ontem, atendendo ao fraco acerto pontual daquele. É daqueles jogadores que parece estar no meio da ponte, onde de um lado está a banalidade e do outro um futuro promissor. Muita da sua sorte de decidirá nos passos que dará a breve trecho, compreendendo que o dinheiro e o chamamento do padrinho de baptismo (Leonardo Jardim) tenham um peso elevado na decisão que tomar.
Iuri Medeiros
Entrou sempre bem, sendo capaz de agitar o jogo, ficando por isso a dúvida se não poderia ter merecido a titularidade. Tenho que confessar a minha falta de isenção na apreciação deste miúdo talentoso. É por isso, por lhe reconhecer grande talento, que o imagino a poder ser titular ou participar com assiduidade na equipa principal. Talvez seja um exagero. Mas jogadores com a sua qualidade técnica e rapidez de execução não há muitos, sendo contudo notório que precisa ainda de crescer e para isso tem de enfrentar mais dificuldades e exigências que não encontra nem numa equipa B, nem mesmo num clube com as especificidades como as que encontrou em Arouca. A ser dispensado, que seja escolhido um clube de forma criteriosa, sendo contemplada a possibilidade de ser revista a situação em Dezembro.
Há uns dias surgiu, numa pequena palestra de José Mourinho, na apresentação da pós-graduação de Treino de Alto Rendimento da Faculdade de Motricidade Humana, a ideia de que “não há treinadores bons, maus e assim-assim”; verdadeiramente “há os treinadores e os destreinadores. Estes são os que pioram os seus jogadores e as suas equipas”, diz o treinador do Chelsea. Disse isto e mais: “os destreinadores não têm o seu conhecimento? Têm e se calhar têm até demais. Não sabem é gerir esse conhecimento”.
É curiosa esta dicotomia lançada por Mourinho, pois, na minha opinião, é um mote que volta a lançar a discussão acerca da formação dos treinadores. Depois da formação formal, através dos cursos de treinador dos vários níveis e das acções de formação que vão sendo realizadas pelo país fora, para obtenção dos créditos necessários para renovação da cédula de treinador e que tanta polémica e discordância traz à tona, surge a formação informal, que é da responsabilidade e escolha do próprio treinador, mediante a motivação e a vontade de melhorar e aumentar a diversidade e a qualidade de conhecimentos.
Tenho um amigo que costuma dizer: “a diferença entre a teoria e a prática é que na prática a teoria é outra…” Uma afirmação carregada de alguma relatividade na medida em que o que estudamos e aprendemos na teoria pode não ser possível experimentar por completo, com todas as variáveis (ambiente, contexto, objectivo, intervenientes ou agentes) que foram possivelmente contempladas, e assim verificar as conclusões teorizadas. Mourinho considera que os aspectos mentais, no seu trabalho, são fundamentais e que tem necessidade de fazer uma reflexão diária e permanente sobre o seu trabalho e o dos jogadores. Dessa forma, o processo é imprevisível e é necessário ter uma grande capacidade de adaptação.
Muitas competências só podem ser adquiridas mediante experiência. Atrevo-me a dizer até que serão todas. Aprendermos algo implica fazer, errar, refazer, acertar, guardar. Tudo aquilo de que precisamos para sermos treinadores deverá ser sempre e constantemente posto em causa, reformulado, partilhado e recolhido, numa lógica de crescimento sequencial. Naquilo que entendo ser o conceito de destreinador, em oposição ao conceito de treinador, será alguém que, tal como Mourinho diz “tem os seus conhecimentos e se calhar até demais mas não sabe gerir esses conhecimentos”. Ele ainda afirma que “o treinador, antes de ser um gestor de recursos humanos, é um gestor dos seus próprios conhecimentos. É preciso ter a capacidade de usar a bagagem de conhecimentos no momento certo.” As circunstâncias, os contextos e os objectivos são dinâmicos, e esse é um problema dos destreinadores. A falta de capacidade de adaptação a vários factores, a incapacidade de ser original e criativo, saber improvisar de forma a lidar com as adversidades, a dificuldade em comunicar, leva a que os atletas sob a alçada destes destreinadores tenham a sua evolução comprometida. Seja em que escalão for, estes destreinadores têm a capacidade de indirectamente piorar o rendimento dos jogadores.
David Moyes, ex-treinador do Manchester United e do Everton
O treinador é o elemento principal que configura o processo de treino dos atletas, e desta forma, a sua relevância neste domínio é decisivo. A aptidão do treinador na criação de contextos favoráveis para a aprendizagem dos atletas é também um aspecto determinante no desenvolvimento dos mesmos. Os destreinadores, pelos exemplos que vou observando em várias modalidades, não estão muito preocupados com os seus jogadores. Focam-se principalmente em certificar-se se eles executam segundo as suas instruções, para obter os seus resultados e alimentar constantemente o seu ego. Normalmente são treinadores que saltam de clube em clube regularmente, não olham a meios para ter consigo jogadores que façam a diferença, são até capazes de ir às formações mas ou estão distraídos o tempo todo ou só lá vão assinar o ponto porque é obrigatório. Não lhes interessa ler, aprender ou ouvir mais coisas acerca da sua modalidade porque acham que aquilo que já sabem é suficiente e perfeito. Ficam satisfeitos em fazer o que fazem, da mesma forma que o faziam há anos.
Guimarães Rosa, um dos escritores brasileiros de todos os tempos, escreveu uma vez que “o animal satisfeito dorme”. Por trás desta pequena e óbvia afirmação reside um dos mais profundos alertas contra o risco de cairmos na pasmaceira existencial e na pobreza intelectual. Se a condição humana desperdiça matéria e energia vital todas as vezes em que se sente completamente confortável com a forma como as coisas já estão, subordinando-se à sedução do descanso e acomodação, então aquilo que fazemos, somos e temos, inclusive no papel de treinador, deve ser alvo de constante reflexão e percepção de que somos quer um serviço, quer um produto inacabado e imperfeito.
Destreinar é desonroso, ignóbil, estúpido, insensato e desprestigiante. Muitos destreinam a pensar que estão a treinar. Outros nem destreinar sabem pois nem consciência têm daquilo que estão a fazer…
Passados seis anos, aconteceu o que nenhum benfiquista esperaria. Jorge Jesus trocou o Benfica pelo seu arquirrival, o Sporting. Rui Vitória foi o nome escolhido para o suceder, e agora que poderemos esperar dele? Benfiquista assumido, Rui Vitória irá sentir o peso do símbolo como Jorge Jesus nunca sentiu e acredito que isso fará alguma diferença. Mas será isso suficiente? Numa altura em que vemos o Sporting a pagar um ordenado de seis milhões de euros ao seu treinador, e o FC do Porto a contratar jogadores a 20 milhões de euros, observamos o Benfica a seguir um caminho que muito se assemelha ao do desinvestimento.
Será isto estratégia? Se o for, foi escolhida na pior altura possível. Num momento em que vemos o Benfica a crescer, conseguindo patrocinadores milionários, levando cada vez mais longe a sua marca e tendo cada vez mais receitas no seu estádio, uma vez que o número de espectadores aumenta de ano para ano, penso que esta estratégia é algo contraditória à realidade que se vem vivendo. Passadas duas épocas em que as águias conquistaram seis títulos e em que os benfiquistas se habituaram a ganhar, Vieira decide apostar na redução de custos a nível salarial, pois contrata um treinador a quem paga menos de metade do ordenado que pagava a Jorge Jesus (um milhão de euros) e reduz o número de activos.
Até aqui tudo bem.
Mas será esta aposta na formação uma boa estratégia agora? Vamos tomar o Sporting como exemplo. Os Leões ganharam dois campeonatos nacionais em 32 anos, e esses dois campeonatos foram conquistados com que tipo de jogadores? Jardel, Ricardo, João Pinto, Beto, Pedro Barbosa, Rui Jorge, Paulo Bento, etc. É certo que alguns foram provenientes das camadas jovens do Sporting, mas quantos deles eram jovens jogadores? A maior parte deles eram já jogadores com calo e conhecedores da realidade do futebol português. Miúdos não ganham campeonatos! Acredito que uma aposta faseada pode ser positiva para o Benfica e mesmo para estes jovens jogadores, mas para essa aposta resultar tem de haver jogadores experientes que os possam “ensinar” as manhas deste nosso campeonato.
É imprescindível ter jogadores que sintam o peso da camisola e que saibam o que é a mística de um clube, para que possam transmitir isso aos mais novos, mas parece que a política que o senhor Luís Filipe Vieira está a adoptar não tem em conta esse tipo de jogadores. Numa altura que as águias sofreram a perda do melhor treinador a trabalhar em Portugal, era imprescindível a continuidade de Maxi, por exemplo. Não seria preferível oferecer um pouco mais de salário a Maxi Pereira e garantir a sua continuidade?
Outra facada nos benfiquistas Fonte: Facebook Ser Benfiquista
Assim, o Benfica arrisca-se a perder um dos jogadores mais experientes no nosso campeonato para o Porto. Quem o vai substituir? Um miúdo? Sejamos francos, assim não conquistamos o tri. Rui Vitória fez um excelente trabalho a valorizar jovens no Vitória, mas sejamos honestos: a realidade do Benfica não é a mesma que a do Vitória. Lembram-se de Paulo Fonseca? Lembram-se do seu trabalho no Paços? E o trabalho no Porto? Se queremos continuar a ganhar títulos e a ser competitivos dentro e fora de Portugal temos de INVESTIR! Temos de contratar jogadores já “feitos” e não produtos que ainda estão a ser lapidados. Temos de ter na Luz caviar em vez de tremoços.
Como já referi, acredito que o Seixal pode ser bastante positivo, mas temos de assegurar jogadores experientes, jogadores que sejam como um “pai” fora de campo e como um “treinador” dentro de campo. De Rui Vitória espera-se um treinador com carácter, sem medo e acima de tudo que arrisque. Estas foram as características que fizeram com que ele chegasse ao Benfica e, se no Guimarães as tinha, no Benfica deve e tem de continuar a tê-las. Este senhor que não se esqueça de que, quando as coisas correrem mal, terá seis milhões de adeptos para o apoiar, mas se não arranjar soluções para os problemas que irão surgir ao longo do campeonato também terá seis milhões de adeptos para o criticar.
É a compra mais cara da História do futebol português. Gianelli Imbula chega ao Estádio do Dragão a troco de uns “cómodos” 20 milhões de euros, proveniente do Olympique de Marselha. Depois de, há uns dias, ter sido anunciado que o médio francês era uma das prioridades do FC Porto para o reforço do plantel, a novela foi de curta duração. O desejo de Imbula era vestir e azul e branco, e o seu desejo será concretizado.
Tendo em conta o panorama económico-financeiro do futebol português, e a necessidade premente dos clubes de reduzir os passivos, podemos afirmar estar perante uma transferência megalómana? Sim, sem sombra de dúvida. Pagar 20 milhões de euros por um jogador assume uma dimensão surreal para o FC Porto. É verdade que, dados os resultados da época passada, o clube está obrigado a mais um ano de forte investimento, já que a “sangria” do plantel tem sido significativa e promete não ficar por aqui; é também verdade que essa “sangria” já proporcionou a entrada de muitos milhões nos cofres portistas, mas não posso deixar de considerar o valor exagerado.
Por outro lado, os contornos do negócio são ainda dúbios: o FC Porto adquire a totalidade do passe do jogador. Algo estranho, já que, supostamente, a Doyen estaria envolvida na transacção. Se tal for mesmo verdade, talvez o investimento direto do clube não tenha sido tão avultado como se julga. E Imbula é uma aposta em grande. É um jogador que, não só pelo dinheiro que custou, mas também pela sua qualidade, terá entrada garantida no onze escalado por Lopetegui e aumentará exponencialmente o nível de qualidade à disposição do treinador.
Imbula chega ao FC Porto depois de duas temporadas em alto nível no Marselha Fonte: Página do Facebook do FC Porto
Aos 22 anos (completa 23 em setembro), chega ao Porto com o rótulo de um dos melhores médios da última edição do campeonato gaulês. Formado no Guingamp, realizou 76 jogos em duas épocas ao serviço do Marselha, para onde se transferiu em 2013. Médio-defensivo de raiz, gosta de pisar terrenos mais adiantados. Tem uma apetência natural para conduzir o esférico com o pé esquerdo, missão que desempenha com distinção, tendo também muita facilidade em “mudar o chip”. Destrói jogo adversário com a mesma facilidade com que constrói para a sua equipa, através do transporte de bola em progressão. O papel que vai desempenhar em termos táticos é, por agora, indefinido, mas arrisco a dizer que o epíteto de box-to-box lhe assentará bem, já que Danilo Pereira deve chegar nos próximos dias para o lugar de trinco. O ideal seria jogar num duplo-pivot, como fazia no Marselha, onde emparelhava com Alaixys Romao, mas não me parece que Lopetegui queira alterar a fisionomia do miolo. Imbula pode ser o próximo “vai-e-vem” do meio-campo portista.
No fundo, o FC Porto acaba por comprar um jogador maduro, que só trará mais-valias ao meio-campo e ao modelo de jogo. Gasta muito dinheiro com ele, mas com certeza que o retorno desportivo compensará o investimento. E o retorno financeiro também: a cláusula de rescisão fixa-se nos 50 milhões, e, mesmo que ninguém chegue a pagar esse valor, a diferença não será substancial. Em termos de “valor puro”, Imbula pode valer mesmo isso. Internacional sub-21 pela França, tem a porta da seleção principal aberta e será só uma questão de tempo até lá chegar. Um negócio seguro, portanto.
Os primeiros Jogos Europeus foram um sucesso desportivo, isto ninguém pode negar, mas e o resto, como foi?
A competição que decorreu em Baku, capital do Arzebaijão, ainda não tinha começado e já tinha duas polémicas. A primeira com a proibição da entrada de vários meios de comunicação – com destaque para o “The Guardian” – e de organizações de defesa dos direitos humanos e a segunda com o atropelamento de membros da comitiva da Áustria.
O primeiro caso não é algo de inédito neste país que conta com vários presos políticos, onde incluo jornalistas. Os jornalistas que conseguiram a entrada (todos os portugueses conseguiram) no país foram avisados de que podiam ser vigiados pelas forças de segurança azeri se tentassem fazer algum trabalho jornalístico que não sobre a vertente desportiva dos Jogos Europeus. Um claro atentado contra a liberdade de expressão e que mostra o estado em que o país vive, o de controlo absoluto.
Ainda sobre a mistura entre política e desporto a que se assistiu da parte do Arzebaijão existiram algumas respostas por parte dos outros países, como é exemplo a Alemanha, onde Angela Merkel se recusou a ir ao país.
As Flame Towers – aqui na prova de ciclismo – são uma das imagens de marca do Arzebaijão
A outra polémica que assolou o início da competição foi o acidente com três nadadoras austríacas. Um condutor de um autocarro investiu a grande velocidade contra as nadadoras, sendo que uma teve de voltar para Viena devido às lesões com que ficou devido ao atropelamento.
Mas fora estas polémicas existiu ainda a preocupação de apenas passarem na televisão as zonas mais modernas da cidade, como provam os locais onde decorreram as provas de Triatlo e de Ciclismo. Zonas modernas e de luxo capazes de fazer inveja a qualquer país. Apesar de isto ser normal neste tipo de competições não deixa de ser curioso terem feito as provas a passar por condomínios fechados.
Passando agora para o plano apenas desportivo existem dois aspectos que gostava de destacar; falo da natação e do atletismo. Estas, que são as duas principais modalidades dos Jogos Olímpicos, aqui tiveram um papel pouco importante. O atletismo ficou reservado aos 12 países que compõem a terceira divisão europeia (Portugal está na segunda divisão) e com isto perdeu grande protagonismo. A natação por seu lado era aberta a todos os países e nadadores desde que ainda fossem juniores. Uma competição deste género tem de ter os melhores nadadores e não os que podem vir a ser os melhores, havendo provas destinadas a estes.
Outro factor que marcou esta competição foi a pouca adesão do público tirando quando a seleção da casa jogava, isto nas competições coletivas. Nas provas de estrada, principalmente no Triatlo, as estradas estavam vazias, provavelmente por as pessoas não poderem ir para os tais locais de que já falei atrás. Em arenas como a Natação ou onde decorreram as Artes Marciais, em que estavam sempre a decorrer provas e não dava para aparecer apenas quando os atletas azeris estavam em prova, também se via pouco público, sendo a grande maioria das comitivas que estavam em prova.
A Rússia dominou o medalheiro e venceu a primeira presença do Futebol de Praia numa grande competição
Quanto ao futuro da competição ninguém sabe responder bem qual é. A ideia da prova é a de ser de quatro em quatro anos, tal como todas as grandes competições desportivas. Mas para já ainda não se sabe onde vai ser a próxima edição depois de a Holanda ter recusado a organização que lhe tinha sido atribuída. Assim a prova pode voltar à Ásia, pois a principal candidata à organização é Istambul. A cidade turca anda há vários anos a tentar organizar os Jogos Olímpicos e vê na organização dos Jogos Europeus a oportunidade ideal para mostrar as suas capacidades organizacionais.
Mas os Jogos Europeus têm um novo adversário: em 2018 nasce o European Sports Championship, uma competição que vai reunir os europeus de Atletismo, Natação, Ciclismo, Triatlo e Remo em Berlim e Glasgow. Isto é um problema uma vez que não faz sentido existirem dois eventos que concentrem as atenções europeias apesar de existirem algumas diferenças entre os mesmos.
O facto de a competição acontecer um ano antes dos Jogos Olímpicos é outra coisa que não me agrada, sendo que na minha opinião a prova devia acontecer a meio da preparação olímpica, ou seja, dois anos antes de uma nova edição. Sendo assim a data da nova competição (2018) era ideal.
Resumindo, esta é uma competição que tem tudo para dar certo no panorama europeu mas que sofre de todos os problemas de algo novo. Para os Jogos Europeus ganharem uma maior credibilidade vão ter de ser organizados por um país da chamada Europa civilizada e sair de países asiáticos que pretendem mostrar que pertencem à Europa, como acontece com o Arzebaijão e a Turquia, se receberem mesmo a próxima edição.
Que prazer é ver esta Argentina quando em dia sim. Juntar Messi, Di María, Pastore e Aguero num campo faz-nos perceber o porquê de amarmos este desporto. Tudo parece fazer sentido quando à inteligência se juntam a enormíssima velocidade de pensamento e execução destes 4. A excelência da exibição de hoje, vincada no massacre do resultado e num futebol ofensivo de sonho, assusta os chilenos para a final e mostra uma Argentina feroz, insaciável e desejosa de recuperar um título que lhe foge há mais de vinte anos.
Azar para o Paraguai, que muito bem se bateu nesta Copa América e já sacudira o paupérrimo Brasil de Dunga para fora da competição, ao ter encontrado a albiceleste inspirada. E quando assim é… muito pouco há a fazer para evitar o descalabro. Com Demichelis e sem Garay, ausente por doença, foi um bem conhecido português a dar o pontapé de saída no pesadelo paraguaio: ao quarto de hora, Rojo aproveitou um ressalto num lance de bola parada para fazer o primeiro. Pouco tardaria para o segundo e, com isso, para o início do festival do extra-terrestre Messi, ao assistir Pastore (que jogo!) para o 2-0 num bom remate cruzado. À meia-hora de jogo a tarefa parecia estar muito bem encaminhada para os homens de Tata Martino. Pois bem, ainda haveria o Paraguai de bater com a mão no peito e fazer valer muito daquilo que o trouxe até esta fase da Copa América à boa maneira sul-americana: o coração. Uma equipa bem montada e organizada, ciente das limitações que a incapacitam de se bater de igual para igual frente aos melhores, mas que nunca se fez rogada e com isso leva uma bonita história para contar desta competição. Foi num belo remate de Barrios – substituiu o lesionado Santa Cruz – que voltaram à vida as esperanças paraguaias, pouco antes do intervalo.
A jogar assim, a Bola de Ouro está mais do que entregue Fonte: Facebook da AFA – Selección Argentina
O pior estava, pois, para vir. Com o 2-1 no descanso não era de prever o que a seguir se passou, até tendo em conta o primeiro encontro da fase de grupos com os mesmos intervenientes. Também aí a Argentina se apanhara a vencer por 2-0 mas o adormecimento nas pampas permitiu o 2-2 ao Paraguai e o massacre da segunda parte pode ser visto como a aprendizagem dos argentinos com esse erro. Di María, cruzado e de encosto (onde esteve este Di María em Inglaterra?), Aguero pelo meio dos centrais e Higuaín a fechar o festival pintaram o resultado final com este esclarecedor 6-1. Três assistências para Messi, duas para Pastore e mais um rol de pormenores deliciosos sem fim do quarteto mágico foram a fórmula perfeita e que o Paraguai se viu incapaz de parar.
Jogando assim, a Argentina estará mais perto do que nunca de recuperar um título há muito desejado pelo país. Já contra a Colômbia dera mostras de querer deixar para trás a sonolência da fase de grupos mas encontrando, aí, um inspiradíssimo Ospina na baliza cafetera. Diante do Chile imagina-se um jogo a uma velocidade estonteante (Di María, Messi, Aguero, Vargas, Alexis e Isla no mesmo campo…) e no qual uma possível vitória argentina estará muito dependente de como o seu sector mais recuado (algo lento) conseguir anular as “balas” de Sampaoli. Mas, enfim, quem tem Messi e não só estará sempre mais próximo da taça do que todos os outros…
A Figura:
Pastore – Depois de uma boa temporada no PSG, Pastore surge em excelente nível nesta Copa América. As duas assistências e o golo de hoje mostram o porquê de a sua titularidade ser mais do que justificada.
O Fora de Jogo:
Defesa do Paraguai – Como disse no texto, muito já havia feito o Paraguai em ter chegado até aqui. Apesar disso, hoje a prestação defensiva da selecção de Rámon Diaz foi sofrível e a meia dúzia foi um pesado castigo.