Era um cenário antecipado e previsível. Os adeptos pareciam estar mentalizados para que viesse a acontecer o pior. E aconteceu. Mas doeu da mesma forma. O choro e a frustração tomou conta de cada adepto do Palmeiras, consumada que estava a descida de divisão do Verdão após o empate a um golo, consentido no fim por um jogador formado no clube (Vagner Love), no Rio de Janeiro, diante do Flamengo. A equipa, que em Julho de 2012 erguera a Copa do Brasil, era, quatro meses depois, “arrumada” para a Serie B, escrevendo-se uma das páginas mais negras do clube.
Outra coisa não seria de esperar para além do imediato regresso à Serie A, e assim aconteceu. Em 2014, após dominar a Serie B, conforme se esperaria, o Palmeiras voltou ao lugar que lhe pertence – à elite do futebol brasileiro. As coisas começaram bem, com um vitória em Criciúma conseguida entre os 83 e os 87 minutos, mas com o desenrolar do campeonato foi-se percebendo que este Palmeiras ainda não tinha a regularidade e a competitividade que fizeram deste um dos maiores clubes da América do Sul. A equipa “arrastou-se” e a época de regresso ao Brasileirão ficou marcada pela ausência de um fio de jogo, que se traduziu num “futebol ruim”, séries enormes de jogos sem vencer (chegaram a ser 10 os jogos sem triunfos, e nas últimas 6 partidas perdeu 5 e empatou 1) e uma goleada ante o Goiás (6-0) que feriu o orgulho da torcida Paulista. Tudo junto, um penoso 16º lugar que colocou a equipa à beira do precipício… outra vez.
O defeso foi, por isso, importante para se reflectir naquilo que se deveria fazer no clube, de forma a mudar-se a mentalidade dentro do balneário e estrutura, direccionando-os para um futuro baseado nos êxitos de um passado cada vez mais distante. Zé Roberto, figura incontornável do clube, fez mesmo um discurso motivacional que ficou famoso nas redes sociais, lembrando o simbolismo da “camisa” do clube paulista.
O início do campeonato deixou muito a desejar. É certo que se venceu o rival Corinthians no Arena Corinthians, mas, fora isso, a equipa não somou qualquer vitória nos primeiros seis jogos do campeonato, caindo para os últimos lugares da tabela, precisamente ao contrário daquilo que “torcida” e direcção desejariam. Cabeças teriam que rolar, e a primeira, como é apanágio no Brasil, é sempre a do treinador. Oswaldo Vieira foi logo afastado, e o efeito chicotada fez efeito: a equipa venceu o Flu no jogo comandado pelo interino Alberto Valentim, e para substituir o antigo técnico foi chamado Marcelo Oliveira, bicampeão pelo Cruzeiro. Isso mesmo, um treinador que aguentou estar no mesmo clube brasileiro durante duas épocas seguidas… e ter sucesso. Na estreia, não venceu o jogo, mas ganhou sinergia e união de um plantel descrente em si. A equipa superou-se e fez o Grémio, uma das equipas em melhor momento de forma no Brasileirão, suar imenso para sair da Arena Grémio com os três pontos.
A partir daqui a confiança cresceu e os resultados são muitíssimo animadores. O Verdão recebeu o rival São Paulo no seu reduto e goleou-o sem apelo nem agravo por 4-0, naquela que foi uma das maiores goleadas de sempre da história do célebre “Choque Rei” – há 16 anos que não se verificava um desnível tão grande no placard do jogo entre as duas equipas e há 23 que o Palmeiras não vencia por estes números. A euforia tomou conta dos adeptos e da equipa, que venceu e dominou os jogos seguintes: bateu o Chapecoense e o Ponte Preta (fora de portas, com a maioria dos seus adeptos na bancada) por 2-0.
Marcelo Oliveira pode ter papel preponderante na ansiada mudança do Palmeiras Fonte: Facebook do Palmeiras
À superfície, esta mudança de resultados pode parecer fruto de um mero aspecto motivacional, mas Marcelo Oliveira não injetou só doses de confiança nas suas tropas. Alterou a forma como a equipa se desdobra no ataque, passando Rafael Marques para uma cena menos de referência, entregando esse papel a Leandro Pereira, e manteve Dudu, peça fundamental desde o início do campeonato; a nível defensivo, o duplo pivô Gabriel-Arouca é agora muito melhor auxiliado pelas descidas de Robinho (um falso “10”, que sabe defender). Isto faz toda a diferença, pois Arouca (sobretudo) também se integra muito bem no ataque, dotando a equipa não só de maior rigor posicional, como também de eficiência ofensiva.
Ainda é cedo para se tirarem conclusões sobre o maior responsável da inversão de resultados do Palmeiras – efeito chicotada psicológica por oposição ao táctico – ,mas uma coisa é certa: Marcelo Oliveira parece ser o treinador certo para o clube e… para o futebol brasileiro (que colecciona mudanças de treinadores como não se vê em mais nenhum campeonato no mundo!). Um treinador que sabe lidar com a instabilidade e, sobretudo, instalar a segurança no longo prazo.
O treinador que pode, definitivamente, tornar uma equipa verdinha no… Verdão, e mostrar ao futebol brasileiro que a chave do sucesso pode estar na estabilidade.
E pronto. Aconteceu. Aquilo que eu mais temia, até. O Brasil nem sequer se apurou para as meias-finais da Copa América, perdendo com o Paraguai nas grandes penalidades, num jogo em que a equipe Canarinha acabou por sofrer mais um golo. O resultado final foi 1-1. É incrível como o Escrete conseguiu obter uma média exata de um golo sofrido por cada partida efetuada nesta edição da Copa América 2015, jogada no Chile. Enfim, mais do que culpas defensivas, o Brasil já não é o mesmo. Há largos anos, aliás. Está a perder terreno, arriscando-se também a ficar de fora da locomotiva vencedora dos próximos tempos. Vamos a fatores que contribuíram para tal.
Primeiramente, depois de 2002, o Brasil, como sempre acontece em países latinos – e incluo no leque dos latinos os países das Américas mas também os da Europa do Sul (portugueses, espanhóis, italianos e também gregos) – partiu para mais um tempo de convencimento. A que chamo eu de convencimento? A altivez? O orgulho? Talvez uma mistura de um e outro atributo… Isso tinha acontecido com o Brasil pós-1962, em que depois de se tornar Bi-campeão do mundo, pensou que não teria de fazer mais nada. Copa sim, Copa não, os títulos iam aparecendo por si só, como a ordem natural das coisas. Enganou-se. O Mundial de 1966 acabou por demonstrar uma terrível lição; que foi muito bem compreendida quatro anos depois. E atente, caro leitor, que quando falo no Brasil não falo obviamente no país inteiro, claro. Falo a quem de direito. CBF, dirigentes e demais autoridades desportivo-futebolísticas. Enfim, o mundo não está parado. As coisas avançam.
Os ideais humanos avançaram. Os direitos avançaram (embora hoje em dia se verifique um claro retrocesso, infelizmente; mas que só poderá levar a uma nova revolução nessa matéria, esperemos). A mentalidade muda. A vida é mutável, portanto. Tal acontece com o futebol, sendo uma pequena fração dessa miríade. Voltando ao ponto de partida deste parágrafo, podemos dizer que o Brasil já não está na linha da frente do futebol. Sei que muitas vezes defendi nesta casa que sim. Mas agora tenho de me render às evidências. Não dá para defender o indefensável. O Brasil está a perder o comboio. Aquilo que os técnicos brasileiros tinham de melhor – e de facto, até certo ponto, eram os melhores do mundo – foi o facto de terem trazido a teoria das modalidades de pavilhão – sempre povoadas pelos professores de Educação Física – para os relvados de futebol. O que fazia que as equipas brasileiras estivessem melhor preparadas que as outras, treinadas por malta da bola antiga e futeboleiros, que faziam as coisas de forma empírica, só porque sim; só porque no “meu tempo também era assim”. Curioso verificar que é isso que está a acontecer com o futebol Brasileiro a nível de clubes e a nível de seleção.
Os brasileiros anseiam por títulos Fonte: blogsalaojuazeiro.com.br
Todavia , não foi por o Brasil ter perdido com o Paraguai que me fez escrever este artigo. Já vem muito de trás. Não nos podemos esquecer de que o Brasil esteve cinco Copas sem sequer ir a uma final. Entre 1974 e 1990, o Brasil não logrou o título, voltando a vencê-lo em 1994; curiosamente numa seleção que muitos autóctones abominaram, pelo suposto futebol defensivo. Mas o que interessa é que ganhou. Essa foi uma lição aprendida pelos brasileiros, sobretudo depois de 1982: “Ai é? Nós damos espetáculo e vocês é que ganham? Esperem lá que nós também sabemos jogar assim.” E assim foi. Entre 1994 e 2002, o Escrete chegou sempre à final e venceu por duas ocasiões. Uma excelente média. Nem vale a pena falar de gerações e da qualidade de cada uma. Claro que há sempre umas que marcam mais que outras. Mas Brasil é Brasil. A qualidade está (sempre) lá.
Outro fator que me chama a atenção é o crescente mediatismo e quase necessidade vital por um craque. Exaspera-se pela figura de um mágico que salve o futebol no Brasil. Agora é o coitado de Neymar (que não tem culpa nenhuma da mediatização). Há uns anos foi Kaká. Daqui a outros vamos ver quem será… e a seleção não sai disto. A meu ver, esta crescente necessidade existencial pela figura do “craque”, primeiro, está a matar o futebol brasileiro; e segundo, foi-nos trazida pela crescente globalização da sociedade americana, que, com o seu capitalismo selvagem, faz sempre exportar a imagem de que é preciso sempre alguém ser o melhor. Quando na verdade não existe “o melhor” sem primeiro haver um coletivo que o molde e lhe dê forma. Ah, e claro, não esquecer o papel pernicioso dos empresários do meio disto tudo: impondo jogadores e fazendo concessões de poder. Mais uma parte obscura do futebol, trazida pelo capitalismo.
Pegando nas palavras do sábio jogador alemão Paul Breitner (campeão do mundo em 1974), o Brasil tem que mudar. Isso aconteceu com a Alemanha, depois do Euro 1996. “Nós pensávamos que não tínhamos que fazer mais nada. Errámos. Tivemos de nos adaptar e voltar a desenvolver”. Essa mudança só vai ocorrer a médio e longo prazo. Uma mudança nas mentalidades dos mais jovens. Talvez não aqueles que joguem o próximo Mundial, nem o seguinte, mas uma coisa pensada com tempo. Coisa que nos países latinos – não apenas no Brasil e nas Américas, claro, mas voltando a referir a Europa do Sul – é muito difícil de acontecer. Até porque se o Brasil tivesse um terço da organização da Alemanha, até hoje não teria vencido cinco Campeonatos do Mundo. No mínimo, teria ganhado uns dez, à vontade.
Tirando só uma nota de humor, como fiz no meu último artigo, os brasileiros não precisam de ficar tristes: vai ser a primeira vez que não jogam a Taça das Confederações desde a sua criação, em meados dos anos 90 do século passado. A tal competição maldita. Nunca o vencedor da mesma se tornou no triunfador no Mundial do ano seguinte. Talvez o problema do Brasil desde 2002 seja mesmo esse: vencer as Copas das Confederações. Ou então a vida é apenas um conjunto de superstições.
O Grande Prémio de Silverstone, Inglaterra, é sempre um dos mais esperados no que toca à F1. Rápido e imprevisível, é constantemente palco de grandes reviravoltas inesperadas. Este fim-de-semana, Lewis Hamilton corria em casa e procurava atingir a marca das 3 vitórias em Silverstone, igualando pilotos como Michael Schumacher ou Niki Lauda.
A qualificação provou, mais uma vez, a curva ascendente que os Williams estão a atravessar. Felipe Massa conseguiu a terceira posição, atrás dos dois Mercedes, enquanto que Valtteri Bottas saiu em quarto, à frente dos Ferrari. Lewis Hamilton, conseguiu, então, mais uma pole-position. Nesta altura, adivinhava-se mais uma fácil dobradinha para os Mercedes; mas a Williams ainda tinha uma palavra a dizer.
O excelente arranque de Massa providencia a ultrapassagem aos dois Mercedes, e também Bottas consegue subir a segundo, embora Hamilton tenha imediatamente recuperado essa posição. O safety-car foi introduzido logo na primeira volta; Grosjean (Lotus) e Button (McLaren) tocam-se e estão ambos fora da corrida. O GP deste fim-de-semana foi acidentado e cheio de peripécias que, aliás, ocasionaram o abandono de diversos veículos: apenas 13 terminaram a corrida.
À sexta volta, Massa permanecia na frente da corrida e era a primeira vez esta época que um GP era liderado por um piloto que não da Mercedes ou da Ferrari. A esta altura, Bottas estava novamente em segundo e a Williams tentava que os dois pilotos se distanciassem, juntos, dos dois Mercedes. Mas aquando da impossibilidade dessa estratégia, autorizam o finlandês a ultrapassar o colega da equipa. Tal manobra nunca chegou a acontecer.
Mais uma vez, a paragem nas boxes foi crucial na estratégia da Mercedes. Na vigésima volta, Hamilton troca de pneus antes dos adversários directos e sai na frente da corrida quando estes param. É nesta altura que se dá um dos momentos mais emocionantes da prova: Massa e Rosberg saem ao lado um do outro do pit-stop, e por pouco o espaço não chegava para os dois. Massa acaba por resistir ao alemão in extremis. As equipas começam, então, a informar os pilotos da ocorrência de chuva dentro de 15 minutos.
A Mercedes, entretanto, diz a Rosberg para dar o máximo e tentar a ultrapassagem a Bottas. Consegue-o a sensivelmente 15 voltas do final, quando a chuva já se fazia sentir. Rosberg faz então 3 voltas brilhantes e não só ultrapassa Massa e sobe a segundo, como se aproxima bastante de Hamilton. Nesta altura, chove torrencialmente e Raikkonen é o primeiro a mudar para pneus intermédios. Lewis Hamilton antecipa-se à equipa e entra nas boxes para mudar os pneus: ao contrário do que aconteceu no Mónaco, esta decisão algo precipitada do inglês viria a valer-lhe a vitória.
Quando todos entram para trocar de pneus, Rosberg fica em pista e é obrigado a fazer uma volta lenta; acabou por perder aqui a corrida. Também os Williams saíram prejudicados das paragens: foram às boxes ao mesmo tempo e quando voltam, já Vettel havia subido a terceiro. A Ferrari acaba por conseguir um inesperado pódio, quando passou ao lado da corrida em grande parte do tempo. Rosberg ainda tentou aproximar-se do companheiro de equipa mas a diferença entre os dois já chegava aos 10s.
Lewis Hamilton volta a vencer em casa e a Mercedes consegue mais uma dobradinha. Azar para a Williams, apesar da evidente melhoria ao longo do Campeonato. Sorte para a Ferrari. Nota positiva para Alonso: o espanhol da McLaren conseguiu os primeiros pontos da temporada, numa época em que o principal objectivo da equipa é já, e apenas, terminar as corridas. A F1 volta no fim-de-semana de 24 a 26 de Julho, na Hungria.
Foto de Capa: Mercedes AMG Petronas e Scuderia Ferrari
A nova época, que está prestes a começar, não vai dar à cidade de Sófia, capital da Bulgária, o sempre escaldante dérbi eterno entre os clubes com mais pergaminhos na cidade, CSKA Sofia e Levski Sofia, os mesmos que, durante décadas, fizeram ecoar o nome do país por essa Europa fora.
Depois de vários períodos altamente conturbados na sua história recente, o CSKA foi este ano despromovido na secretaria, a expensas de dívidas incobráveis a várias entidades oficiais do país e também salários em atraso de antigos jogadores e funcionários. A Federação Búlgara de Futebol (BFU), liderada pelo antigo internacional búlgaro e guarda-redes do Belenenses, Borislav Mihailov, não “perdoou” o antigo gigante do futebol do leste da Europa e retirou-lhe a licença que lhe permitia disputar o A Group (Liga Profissional Búlgara de Futebol A), condenando-o assim a uma longa travessia no deserto do futebol amador daquele país. Na próxima temporada, o histórico CSKA vai disputar a 3ª divisão do futebol búlgaro (Bulgarian V AFG), vendo-se assim obrigado a começar tudo de novo naqueles recantos onde a relva já não cresce e onde não poucas vezes a bola se torna num mero acessório durante uma partida de futebol.
No passado mês de Junho, um dos empresários mais poderosos do país, Grisha Ganchev, anunciou que iria, em parceria com outro empresário de sucesso, de seu nome Yuliyan Indzhov, assumir o controlo do CSKA, evitando assim uma eventual fusão com outra equipa da cidade numa tentativa de evitar a despromoção, conforme havia sido noticiado pelos meios de comunicação. Numa entrevista recente, Plamen Markov, uma antiga estrela da equipa e o novo Director Desportivo do CSKA, afirmou que não passa pela cabeça de ninguém envolvido neste novo projecto não ser possível regressar ao futebol profissional dentro de dois anos, algo que, caso venha mesmo a acontecer, marcaria certamente o fim dos lendários Армейците (Armymen).
Apresentação do novo treinador Hristo Yanev (segundo a contar da esquerda na foto) Fonte: Focus Sport
A nova direcção apresentou Hristo Yanev, um antigo internacional e talentoso médio búlgaro que já jogou, entre outros, no CSKA Sofia em duas ocasiões distintas, como novo treinador, que aos 36 anos de idade terá pela frente a hercúlea tarefa de devolver o histórico emblema búlgaro aos campeonatos profissionais daquele país do leste europeu.
Esta súbita despromoção é uma autêntica nódoa na história de um clube como o CSKA Sofia, que, durante décadas a fio, marcou – e de que forma! – o futebol búlgaro e mesmo o europeu, quer através das suas conquistas a nível nacional, quer através do talento de várias gerações de futebolistas que colocaram o clube na elite do futebol do velho continente.
Hristo Stoichkov, Emil Kostadinov, Lyuboslav Penev, Trifon Ivanov, Stiliyan Petrov, Georgi Dimitrov e Plamen Markov, entre outros, marcaram vincadamente as décadas de ouro do futebol búlgaro. As vitórias contra o Notthingham Forest FC, o Liverpool e o Bayern Munich, no início da década de 1980, deram ao CSKA uma projecção invejável na Europa futebolística, ao mesmo tempo que uma sólida produção de novos talentos, em constante desenvolvimento, permitiam ao CSKA conquistar seis campeonatos nacionais em dez anos, relegando assim os seus eternos rivais, Levski, para segundo plano. Foi precisamente num desses sempre escaldantes dérbis que teve lugar um dos piores episódios (provavelmente apenas destronado por esta abrupta descida de divisão) da história do CSKA. Em 1985, numa final da taça da Bulgária disputada no outrora imponente Vasil Levski National Stadium, o CSKA Sofia, que à época estava a atravessar um período de transição com a chegada à equipa de talentosos jovens como Hristo Stoichkov, enfrentava um bem estruturado e poderoso Levski, que contava na altura com jogadores como Nasko Sirakov, Plamen Nikolov, Emil Spasov e Bozhidar Iskrenov.
Equipa do CSKA Sofia 1988-89, da qual fazia parte entre outros, Hristo Stoichkov Fonte: Sibir
O jogo tinha tudo para ser mais um memorável eterno dérbi do futebol búlgaro, mas acabou por ficar na história pelos piores motivos. Uma bola que Georgi Slavkov aparentemente controlou com o braço e que culminou no primeiro golo do CSKA e um hipotético penálti sobre Iliya Voinov quando o resultado já estava em 2-0 foram suficientes para incendiar os já irados adeptos das duas equipas e também os jogadores, que durante toda a partida se envolveram em diversas escaramuças, com cartões vermelhos a voarem, literalmente, para uma e outra equipa, deixando, ainda assim, muitas vezes os verdadeiros perpetradores passar incólumes. O jogo terminou com o resultado de 2-1 para CSKA, mas o que estava para acontecer, consequência das cenas de violência física e verbal a que os búlgaros assistiram durante toda a partida, viria a entrar para os livros de história do futebol. O Comité Central do Partido Comunista Búlgaro, liderado à época com mão de ferro por Todor Zhivkov, resolveu dissolver as duas equipas e voltar a criá-las sob uma nova gestão.
O CSKA passou a chamar-se numa fase inicial Sredets e o Levski passou a ser conhecido por Vitosha; ambos os treinadores foram despedidos e vários jogadores das duas equipas foram banidos para sempre do futebol búlgaro. Hristo Stoichkov, por exemplo, foi condenado por violação da moral socialista e por holiganismo, algo que poderia ter arruinado a sua carreira, como o próprio admitiu mais tarde numa entrevista. Plamen Nikolov e Emil Spasov, por seu lado, sofreram um rude golpe nas suas carreiras, uma vez que tinham já pré-acordos assinados com o FC Porto e viram os mesmos anulados pela Federação Búlgara de Futebol (BFU).
Sem o dérbi eterno e sem o CSKA Sofia, o futebol búlgaro ficará inevitavelmente mais pobre; ainda assim, nada disto demove os fervorosos adeptos dos Армейците (Armymen), que já fizeram questão de afirmar que não irão abandonar a equipa nesta nova dura etapa que os espera. Do outro lado da barricada, Stoycho Stoev, actual treinador dos vizinhos e rivais Levski, foi também peremptório ao afirmar que o dérbi eterno é algo que nunca poderá ser substituído e, num acto de raro desportismo, desejou que o CSKA regressasse rapidamente ao convívio entre os grandes.
Foto de Capa: ‘Portal CSKA’ – Site relativo ao CSKA em búlgaro
O Chile inteiro parece ter entrado pelo Estádio Nacional Julio Maríntez Prádanos adentro. As bancadas coloriram-se do vermelho e branco das milhares de bandeiras chilenas ferverosamente agitadas por um público que viveu esta Copa América como o momento histórico que a competição, de facto, constituiu para um povo que, não fugindo à regra sul-americana, vive o futebol de uma forma que só entusiastas do desporto-rei conseguirão entender.
O hino argentino foi assobiado, o chileno cantado… perdão, gritado, a plenos pulmões, com uma entrega que se esperava contagiante, das bancadas para o campo.
O Chile, embalado pelo fervor das bancadas, começou melhor o encontro, pressionante sobre a área argentina, à medida daquilo que vinha fazendo contra os adversários que teve pela frente até à final, não se atemorizando pelo nome do adversário, anulando com determinação e, até, alguma agressividade as intenções contrárias (Vidal e, sobretudo, Aranguíz importantíssimos neste capítulo, auxiliando o “joker defensivo” chileno, Marcelo Díaz, que tanto fez de trinco como central quando os laterais subiam no terreno) de forma a lançar um ataque caracterizado pela abundância – de homens e talento. O primeiro lance de perigo ilustrou isto mesmo, culminando com um remate de Vidal a causar dificuldades ao guarda-redes argentino, Sergio Romero.
A Argentina só conseguiu reagir por bola parada – livre batido por Messi, cabeceamento de Aguero e defesa apertada de Claudio Bravo. O ataque organizado alviceleste ia sendo, portanto, neutralizado, e as coisas ficaram ainda piores quando Angel Di María se lesionou (entrou Lavezzi). Tomando conhecimento da superioridade chilena, a Argentina reorganizou-se (Pastore, Lavezzi e Messi vieram mais atrás buscar jogo, Rojo e Zabaleta deixaram de subir tanto) e não permitiu tanta posse ao adversário, conseguindo, até, ganhar algum terreno com esta mudança estratégica, exibindo-se em bom plano nos últimos quinze minutos do primeiro tempo, culminados com um bom lance de envolvência ofensiva – Lavezzi lançou Pastore no flanco esquerdo, Messi e Aguero deslocaram a marcação, deixando espaço para o “inventor” da jogada rematar para uma boa intervenção do guara-redes chileno.
Higuain falhou uma grande penalidade decisiva Fonte: goal.com
A segunda parte trouxe mais do mesmo daquilo que se foi vendo na primeira meia hora de jogo, com o Chile a tomar o controlo do encontro, tendo como “capitães” da batalha do meio-campo Aranguíz e Marcelo Díaz, a oferecer mais posse de bola ao ataque chileno e “secando” completamente o ataque argentino. As situações de perigo criadas por La Roja, porém, eram escassas, apesar da vontade – Sanchez roubou a bola a Otamendi após uma má recepção do central do Valência nos primeiros segundos de jogo, mas isso apenas resultou num cruzamento para um cabeceamento inofensivo de Vidal à figura de Serigo Romero.
Até ao final do tempo regulamentar, a intensidade mantinha-se, mas a bola ia passando cada vez menos pelas extremidades do terreno de jogo, algo a que não estaria alheio o medo de não perder perante a proximidade do prolongamento. Ainda houve espaço, porém, para mais duas oportunidades de perigo – Sanchéz, num remate espectacular, de primeira, atirou ao lado da baliza de Sergio Romero, e Higuaín concluiu um contra-ataque argentino, lançado por Messi, com um remate à malha lateral da baliza chilena naquele que foi o último lance de perigo do tempo regulamentar.
O prolongamento não trouxe muito ao jogo, revelando fragilidades físicas esperadas de ambos os lados (embora o Chile estivesse mais fresco tanto pelo facto de não ter esgotado as substituições como pelas 24 horas a mais de descanso entre a meia-final e o jogo decisivo) e heróis da entrega, como Zabaleta, que emendou um erro de Mascherano, indo incomodar ao flanco direito (!!!) um remate perigoso de Alexis Sanchez, que não saiu conforme o atacante desejaria por força da intervenção do lateral do Manchester City, naquela que foi a única oportunidade de perigo do tempo extra.
O Chile venceu pela primeira vez a competição Fonte: globoesporte.com
Nos penalties, Higuaín e Banega falharam e coube a Alexis Sanchez a decisão de dar o primeiro título da história do Chile. Não era o tudo o nada da La Roja, mas entre a marca dos onze metros e a baliza de Romero estava, então, a distância de se agarrar uma oportunidade única – o Chile atuava perante os seus adeptos e tinha à sua disposição a selecção mais talentosa de sempre. Alexis avançou para a bola e, fervilhando nas suas veias uma mistura de loucura e frieza, executou, devagar, um penalti que colocou em suspenso toda a nação chilena mas que terminou no fundo das redes e significou um dos momentos mais felizes desta nação.
Um penalti que fez parar a respiração de um país inteiro, momentos em que a história ainda não se tinha escrito e a alegria ainda não tinha tido autorização para se soltar. Segundos que duraram horas, todos eles angustiantes, mas que, no fim, valeu a pena suportar.
O futebol tem destas coisas… apaixonantes.
Figura do Jogo: Charles Aranguiz – Foi o principal responsável por travar um dos melhores ataques do mundo em selecções. Pareceu omnipresente, desdobrando-se em desarmes um pouco por todo o terreno, nunca se desorganizando. Foi o capitão da batalha do meio-campo ganha à alviceleste e que permitiu ao Chile alcançar a superioridade na posse de bola, fundamental para neutralizar o ataque argentino e manter a confiança chilena na conquista da Copa América. No prolongamento, manteve a entrega e revelou uma enorme disponibilidade física.
Fora-de-jogo: Javier Pastore – Pastore não teve, propriamente, a exibição mais pobre da carreira, mas esteve muito apagado durante a partida e, apesar de ter pela frente um batalhão de incansáveis (sobretudo Aránguiz), exigia-se mais intensidade e entrega ao avançado do PSG.
Depois de André André, Sérgio Oliveira e Carlos Eduardo, Giannelli Imbula e Danilo Pereira são as mais recentes contratações para o meio-campo azul e branco. Cinco jogadores que se juntam a um meio-campo bem apetrechado onde figuram Rúben Neves, Herrera, Evandro e Quintero. São nove jogadores para três posições do tão já afamado 4x3x3 portista. Jogadores a mais para posições a menos.
A pergunta óbvia tem ocupado a cabeça de muitos portistas. Como encaixar tanta gente em tão poucas posições? Uma parte da resposta parece-me mais do que óbvia. Alguém vai sair:
– Carlos Eduardo, emprestado ao Nice na época passada, valorizou bastante depois das boas exibições em terreno francês. Neste momento, a grande dúvida parece ser mesmo o clube que o vai acolher na próxima época. Mónaco ou Nice, diz o jornal francês L’Equipe.
– Evandro? Pessoalmente, gosto bastante de Evandro. Considero-o um jogador inteligente e que oferece bastantes garantias quando entra. Para além disso, e como nós bem sabemos, é um bom marcador de grandes penalidades.
– Quintero… enorme criatividade num pé esquerdo fabuloso. Mas há sempre algo que parece faltar ao colombiano. E a nível defensivo, muitas são as bocas azuis e brancas que lhe exigem mais.
– Herrera? Talvez tudo se resuma à prestação do mexicano na Gold Cup. Se Herrera voltar a destacar-se, como já aconteceu no Mundial, poderá ser um sério candidato à saída.
As expetativas que recaem sobre as duas contratações anunciadas são enormes. Se em relação a Danilo já se sabe o que esperar, o preço de Imbula é mais do que suficiente para deixar os adeptos portistas a sonhar. Ora, parece que há duas posições no miolo portista que estão entregues e, ao contrário do que aconteceu na época passada com Casemiro, parece finalmente existir capacidade para começar a construir (com qualidade) a partir do médio defensivo.
Força, velocidade, visão de jogo, poder de choque, inteligência, posicionamento… Tudo neste meio-campo que se está a formar parece delicioso. Falta ocupar a última vaga. E agora? Quintero, André André, Herrera…? Deixem-me criar ainda mais confusão neste grande quebra-cabeças. Brahimi é um jogador que tem deixado muitos clubes a salivar. Para além disso, o investimento no argelino é grande e as esperanças em que este se valorize são altas. Brahimi já jogou no centro do terreno e há muitos portistas a pedir que o craque assuma a posição mais avançada do miolo portista.
E agora, Lopetegui? O que é que reservas para toda a comunidade portista? Para além dos títulos, claro…
Todos os amantes do ciclismo – e não só – já têm os olhos postos no dia 4 de julho, sábado, para a maior prova de ciclismo e para uma das maiores provas desportivas do mundo: a Volta à França!
Esta edição promete ser a melhor dos últimos anos e uma das melhores das últimas décadas. Tudo devido a um grande elenco de ciclistas, dos melhores desta modalidade, a um muito bom percurso, que favorecerá os trepadores, e, igualmente, por todas as condições a que se chega a esta prova. Por felicidade, poderemos finalmente contar neste Tour com os “Fantastic Four” do Ciclismo (os quatro melhores corredores de Grandes Voltas, atualmente): Chris Froome, Nairo Quintana, Vincenzo Nibali e Alberto Contador. Qualquer um deles tem todas as condições possíveis para sair com a camisola amarela de Paris, e nenhum, à partida, ficará contente com “apenas” o 2.º lugar. Juntos são, respetivamente, o campeão de 2013 do Tour, o 2.º classificado do Tour de 2013 e vencedor da classificação da juventude, o campeão em título e, por fim, o vencedor das edições de 2007 e 2009 do Tour e vencedor do Giro deste ano. Juntos, apresentam sete vitórias nas últimas oito Grandes Voltas. Para além disso, é possível constatar que iremos ter uma primeira parte de prova onde o nervosismo poderá tomar conta de certos ciclistas (a etapa de pavé – piso empedrado – voltará a ser decisiva?) e uma segunda parte que contará com muita montanha e muitas oportunidades para incríveis embates entre os melhores. Tudo isto cria uma expetativa enorme para esta 102.ª edição da Volta à França, que irá decorrer entre 4 e 26 de julho, sendo que poderão ver todas as etapas na Eurosport ou na RTP2.
As quatro maiores “estrelas” desta Volta à França 2015 FONTE: Carro Vassoura
Em relação ao percurso delineado para este ano, existem alguns destaques. Tal como já foi referido, voltaremos a ter uma etapa de pavé, na 4.ª etapa, com sete setores num total de 13,3 km’s. Antes disso, na 3.ª etapa, iremos ter o “temível” Mur de Huy (pela primeira vez, a etapa irá finalizar nessa zona) – habitual numa das maiores clássicas do ciclismo, a Flèche Wallone. E logo no primeiro dia de prova um contrarrelógio individual que irá criar as primeiras diferenças entre os principais favoritos e onde os especialistas neste tipo de etapa estarão totalmente focados em vencer a etapa para poderem andar alguns dias de amarelo – Tony Martin, Tom Dumoulin, Fabian Cancellara, Adriano Malori e Rohan Dennis serão, em princípio, os protagonistas desse dia. Na 9.ª etapa, logo anterior ao primeiro dia de descanso, dá-se o contrarrelógio por equipas, que poderá ser decisivo para certos homens na luta pelo top10. Logo a seguir ao já referido descanso, iremos ter o primeiro final em alta montanha. Como normal, a segunda semana de competição estará mais virada para os Pirenéus, enquanto a terceira e decisiva semana estará concentrada nos Alpes (no penúltimo dia de prova iremos ter a tão esperada subida ao Alpe d’Huez). Estas 21 etapas, com um total de 3360 km’s, e este Tour 2015 terão o seu fim nos já tradicionais Campos Elísios, em Paris.
Voltando aos quatro principais favoritos. Froome, com a vitória no Dauphiné, mostrou que está em muito boa forma e pronto para voltar a vencer o Tour. A primeira semana será decisiva para ele; tanto terá, por um lado, um contrarrelógio que, em princípio, lhe fará ganhar alguns segundos aos seus grandes adversários (mesmo assim, acredito que ele tivesse preferido um CR ainda mais longo), como também terá, por outro lado, a etapa de pavé, que no ano passado lhe custou o Tour. Se passar bem essas dificuldades, aproveitar bem a ajuda da sua equipa (muita qualidade e muita ajuda para todos os terrenos na equipa da Sky para este ano) e continuar a mostrar que é realmente um trepador de excelência e um ciclista ainda mais experiente, será muito difícil que alguém lhe consiga tirar a camisola amarela no final.
Quintana poderá ser o principal rival de Froome nas montanhas se conseguir, igualmente, passar bem a primeira semana deste Tour. Precisará muito da ajuda da sua equipa na primeira parte da prova, sendo que fará o que melhor sabe na segunda parte da mesma. Resta saber se o CR individual e a etapa de pavé não irão deitar por terra as suas ambições. Terá, se tudo correr como o perspetivado, a ajuda de Valverde para conseguir o lugar mais alto do pódio, logo esse será um grande trunfo para o colombiano, visto que tem um dos melhores ajudantes que um líder poderia ter. Falta saber é se o espanhol estará virado para esses lados… Se estiver, então é mais do que provável que ambos estejam no top10 final da prova e as possibilidades de Quintana e, consequentemente, de a Movistar vencerem este Tour serão elevadas.
O vencedor do Tour de France 2014 terá forte concorrência para tentar revalidar o seu título Fonte: CTVNews
Um dos ciclistas que apontou exclusivamente o seu grande pico de forma para o Tour foi mesmo Nibali, que aparece nesta prova como o campeão em título e pronto para revalidar esse mesmo título. Acabado de se sagrar campeão italiano (tal como no ano passado), o ciclista da Astana é aquele que mais beneficiará das piores condições climatéricas possíveis e que terá na primeira semana a chave da sua candidatura ao título. Tem uma equipa forte para o ajudar e é um dos ciclistas que mais beneficiam das longas descidas (não tem medo de arriscar e tem imensa técnica). Veremos o que acontecerá na muito mencionada etapa de pavé e se voltaremos a ter um Nibali a destacar-se da concorrência aí.
Por fim, Contador tem como objetivo vencer o Giro e o Tour no mesmo ano, feito que foi realizado pela última vez em 1998 por meio de Marco Pantani. Ninguém tem dúvidas da qualidade do “Pistolero”, mas depois de um Giro muito competitivo e desgastante as dúvidas são muitas acerca do que poderá o espanhol ainda dar neste Tour. A verdade é que, se existe alguém capaz de fazer este feito, esse alguém é o próprio Contador. Tal como os seus adversários, conta com uma boa equipa para o ajudar. O grande problema é que, mesmo assim, se certos ciclistas não derem mais do que o que ultimamente têm dado, iremos ver o espanhol a sofrer mais do que o costume. A conquista não é impossível, mas dificilmente Contador, com esta concorrência e com o Giro que realizou, vestirá de amarelo no último dia. Resta esperar para ver se, mais uma vez, o espanhol trata de responder a todos da melhor forma na estrada.
Em termos de nomes para o top10/top15, poderemos encontrar uma extensa lista de ciclistas. Começando logo pela maior esperança de todos os franceses em vencer um Tour nos próximos anos, Thibaut Pinot (apresenta-se em grande forma, tem um percurso à sua medida e quererá provar que o pódio conseguido no ano anterior não foi devido ao facto de Froome e Contador terem desistido); Romain Bardet, outra das maiores esperanças dos franceses, tem também uma prova bem adaptada às suas qualidades e também está em boa forma; Joaquim “Purito” Rodriguez é outro dos grandes nomes aqui presentes e que, sem dúvida, irá dar enorme espetáculo em várias etapas, sendo que tem mesmo um percurso bem feito para as suas caraterísticas e, mesmo com a possível perda de tempo na 1.ª e na 9.ª etapas, terá na segunda parte da prova imensas oportunidades para compensar o possível tempo perdido – não esquecer que terá como fiel escudeiro o português Tiago Machado; Tejay Van Garderen é mais um dos grandes nomes nesta corrida e, tal como os acima mencionados, tem toda a capacidade para terminar no top5 (provou, no Dauphiné, que subiu um patamar na sua evolução como ciclista quando se bateu da melhor forma frente a Chris Froome e está pronto para mostrar isso neste Tour, sendo que terá na BMC uma equipa que o poderá meter de amarelo quando terminar o contrarrelógio por equipas).
Rui Costa, recém campeão nacional, é um dos principais candidatos a estar no top10 Fonte: Gazeta do Rossio
Rui Costa, o ex-campeão do mundo, o melhor ciclista português da atualidade e recém campeão nacional de estrada, será outro dos nomes a ter em conta para o top10 desta Volta à França. Irá com menos pressão do que no ano passado, chega a esta prova com um excelente 3.º lugar no Critérium du Dauphiné – com, igualmente, uma enorme vitória frente a alguns dos melhores ciclistas do pelotão mundial – e, mostrando plenamente todas as suas qualidades como ciclista, terá tudo para chegar ao tal objetivo dos 10 primeiros. Outros nomes a ter em conta, para além dos já referidos, são: Alejandro Valverde (está a fazer mais uma grande época; não é o líder da equipa, mas isso não me parece que possa ser um problema na estrada e será um corredor com menos pressão em cima, visto que Quintana é o líder designado, sendo que tem igualmente algumas etapas ao seu estilo – destaque claro para a etapa do Mur de Huy), Bauke Mollema, Warren Barguil, Matthias Frank, Pierre Rolland, o duo da Lotto Wilco Kelderman e Robert Gesink, o trio da Garmin Daniel Martin, Andrew Talansky e Ryder Hesjedal, ou duo da Etixx Rigoberto Úran e Michal Kwiatkowski, entre mais alguns outros ciclistas que poderão intrometer-se nesta luta.
Para os sprints e para a camisola verde, existe igualmente um elenco muito bom de ciclistas (mesmo com a grande ausência de Marcel Kittel, vencedor de quatro etapas no Tour 2014): Mark Cavendish será o grande favorito a “suceder” a Kittel como o homem dos puros sprints deste Tour, sendo que terá a companhia de André Greipel, Nacer Bouhanni, Tyler Farrar e Edvald Boasson Hagen, Arnaud Demaré e Sam Bennett. Além destes nomes, há que acrescentar, claramente, os principais favoritos a vencer a camisola verde (alguns dos anteriormente citados dificilmente lutarão por esta camisola), relativa à classificação dos pontos: Peter Sagan parte, naturalmente, como o favorito a vencer a sua 4.ª camisola verde seguida mas, desta vez, terá a grande concorrência de nomes como Alexander Kristoff (vencedor de inúmeras etapas esta época e com uma Katusha a dar-lhe um bom apoio para a disputa desta camisola verde), John Degenkolb (com a ausência de Kittel, o ciclista da Giant terá toda a ajuda possível nos sprints, quer nas etapas mais planas, quer nas etapas mais atribuladas) e, por fim, Michael Matthews (em princípio, será o que menos hipóteses terá de vencer esta camisola, visto que irá repartir a liderança nos sprints menos planos com Simon Gerrans, logo terá menos pontos à disposição do que os seus adversários).
Alguns dos principais sprinters presentes, que prometem animar esta edição, a lutarem pela vitória numa etapa Fonte: Velonews
Referir ainda que, além de Rui Costa e de Tiago Machado, os restantes portugueses em prova são Nélson Oliveira (irá ser uma ajuda crucial a Rui nas etapas mais planas) e José Mendes (terá um papel mais livre dentro da sua equipa, o que poderá proporcionar algumas idas em fugas e, consequentemente, quem sabe, uma vitória de etapa).
Posto isto, este sábado será a hora de nos concentrarmos na melhor prova de ciclismo do mundo e ver, atentamente, os maiores protagonistas desta modalidade numa prova onde as expetativas estão tão altas que poderemos vir a ter um dos melhores Tour’s de sempre…!
Ainda ontem, no dia 2 de Julho de 2015, revi pela 128ª vez todas as imagens respeitantes às exéquias fúnebres de Eusébio da Silva Ferreira. Sempre com um olhar carregado, como que não acreditando ainda que esta lenda nos abandonou, muito nostálgico. Dir-me-ão que fico assim porque sou benfiquista da cabeça aos pés e eu responderei que talvez isso tenha muita influência, mas mesmo que fosse adepto de um outro clube…penso que admiraria sempre o Pantera Negra. Escrevo este artigo ainda antes da cerimónia de trasladação ter início, por isso não descreverei nada daquilo que se irá passar.
Quando se deu a trasladação dos restos mortais de Amália Rodrigues para o Panteão Nacional, no dia 8 de Julho de 2001, eu virei-me para o meu pai e soltei um “tenho a certeza de que com o Eusébio vai acontecer o mesmo”, apesar da minha ainda prematura idade. E tal como eu previ há quase catorze anos, isso vai mesmo acontecer. E como podia não acontecer? Estamos a falar de um homem que fez com que fosse possível um norte-americano conhecer Portugal, estamos a falar de um homem que prendeu milhões de portugueses ao transístor, estamos a falar de um homem que reúne consensos na sociedade portuguesa como quase ninguém conseguiu até hoje. Futebol não é cultura? Será indecente tratar Eusébio como se trataram (ou não se trataram) escritores, grandes nomes da música e do cinema? Não, não é indecente. Eusébio é e sempre será um símbolo deste país à beira-mar plantado, Eusébio foi um homem amado e venerado em complicados tempos ditatoriais, Eusébio era visto pelo povo com um dos seus, um homem que a pulso singrou na vida e que com a sua humildade continuou a manter exactamente as mesmas rotinas.
O Benfica e a bola: os dois amores do King Fonte: terceirotempo.bol.uol.com.br
Sinto-me um adepto abençoado. Felizmente foi no Sport Lisboa e Benfica que o Pantera Negra fez carreira, não há ninguém maior do que ele na história do clube, falar-se do Benfica é falar-se de Eusébio. Tal como escrevi no ano passado, a morte de Eusébio provocou momentos arrepiantes em grandes palcos como o Santiago Bernabéu e Old Trafford, foi motivo de notícia em todo o mundo, colocou em suspenso toda uma cidade de Lisboa debaixo de um temporal impiedoso. Os céus revoltaram-se contra a morte ainda prematura de uma lenda, de um dos grandes ícones do século XX português, um dos últimos heróis do povo a abandonar-nos. Impossível Eusébio da Silva Ferreira não merecer todo este aparato, todas estas cerimónias, é o mínimo que se pode fazer por alguém que catapultou Portugal para além do miserabilismo latente que por cá vigorava, dalguém que fez parar por milhentas vezes uma nação adormecida.
Tenho 26 anos, mas mal comecei a ver futebol vi em Eusébio uma referência. Sempre vi vídeos seus, sempre comprei cassetes e dvd’s referentes a este monstro sagrado do futebol mundial, sempre que o via a falar na tv parava, como que em sinal de continência. No dia em que ele morreu petrifiquei, não saí do sofá, fiquei incrédulo. No dia seguinte não pensei em mais nada, só quis estar presente no Estádio da Luz e no funeral. Debaixo de uma chuva incessante, vendo ali milhares de pessoas não se importando com isso, eu voltei a constatar o quanto Eusébio da Silva Ferreira era respeitado no nosso país. Voltaria a fazer tudo de novo, de uma forma quase estúpida não me perdoo por nunca tê-lo visto jogar, mas todo o legado que ele deixou foi mais do que suficiente para me apaixonar pela sua história de vida.
Hoje é um dia especial. Hoje é mais um dia de Eusébio da Silva Ferreira. Os seus restos mortais irão para o Panteão Nacional, casa dos deuses, dos nunca esquecidos. Do Panteão para todo o país, para todo o mundo, tal como só os heróis o conseguem. Não irei alongar-me muito mais, tal como já disse esta sexta-feira é do homem que saltou de Mafalala para o resto do planeta, mas sempre que escrevo sobre ele vêm-me à cabeça imagens sem fim.
A morte de Eusébio parou o país Fonte: Facebook Oficial Museu Cosme Damião
Aquele momento, após o Inglaterra 2-1 Portugal das meias-finais do Mundial 66, em que Eusébio da Silva Ferreira chorou de uma forma compulsiva depois da eliminação da selecção portuguesa acompanha-me desde que me lembro de mim próprio. Lágrimas de tristeza, lágrimas derramadas há 49 anos atrás, lágrimas que se perpetuaram no tempo e que hoje são comungadas por mim e por uma imensidão de gente.
Obrigado, Eusébio. Obrigado por me fazeres sentir que falarei sobre ti exactamente da mesma forma até ao fim dos meus dias. Obrigado pelos teus préstimos ao Sport Lisboa e Benfica e a Portugal. Obrigado por seres um dos meus ídolos. Enfim, obrigado por tudo. Um ser humano só pode agradecer por teres feito parte deste mundo.
Durante longos anos de uma ditadura cinzenta e opressiva, Portugal viveu sob o espectro dos três “f”: Fátima, Família e Futebol, sendo que antes do “f” de Futebol surgia o “e” de Eusébio, a maior lenda do desporto rei nacional antes do aparecimento mais ao menos recente de Cristiano Ronaldo.
É inegável reconhecer a importância do “Pantera Negra”, futebolista que fica umbilicalmente ligado ao período mais vitorioso da história do Benfica, mas também à primeira e até agora melhor participação de Portugal num Campeonato do Mundo, quando foram os seus 16 golos (sete na qualificação e nove na fase final) a contribuírem de sobremaneira para um brilhante terceiro lugar no Inglaterra 66.
Os números, aliás, não deixam qualquer margem para dúvidas do impacto que teve Eusébio no futebol nacional, tanto pelos 476 golos em 440 golos pelo Benfica, como pelos 41 golos em 64 jogos pela “Equipa das Quinas”. E se antes do “Pantera Negra” já Fernando Peyroteo se tinha assumido como um grande goleador luso e até com melhor média de tentos, a verdade é que Eusébio surge numa fase em que a mediatização do futebol já era muito maior, sendo ele a primeira grande figura de exportação nacional.
Eusébio destacou-se no Benfica Fonte:architectninja.com
Afinal, durante um longo período em que a imagem de Portugal no Mundo alternava entre o apagamento e a (má) crítica, Eusébio foi uma espécie de farol de positivismo, funcionando como o nosso melhor embaixador no planeta, ou não trouxessea melhor notoriedade possível para um pequeno e algemado país. Essa boa imagem, aliás, arrasta-se até aos dias de hoje, mesmo depois da sua morte, com o nome e o impacto do antigo atacante a continuar a confundir-se com o próprio Portugal.
E se naturalmente Eusébio não foi o única personalidade a contribuir para essa melhor imagem de Portugal no estrangeiro, é inegável que esta sua iminente trasladação para o Panteão Nacional acaba por traduzir-se nesse merecidíssimo reconhecimento.
É que o impacto e simbolismo à volta deste génio de Lourenço Marques irá estar sempre muito para além dos golos, grandes exibições e títulos que ajudou a trazer para o Benfica e para a selecção nacional, e centrar-se-á igualmente na talcontribuição para uma melhorimagem de Portugal no Mundo, algo queperdura até hoje e certamente continuará a perdurar por muito mais tempo. Issonão tem preço e, na minha opinião, nem deveria permitir que se questionasse sequer a sua presença no Panteão Nacional. Se outros também mereciam lá estar? Obviamente que sim, mas como costumam dizer os ingleses: “Two wrongs don’t make a right”.
Ao longo da infância, a televisão, os livros, o cinema e a música trazem ao nosso olhar figuras que marcam a nossa vida. Seja aquela banda pela qual nós despendemos uma fortuna apenas por causa de um concerto, seja por aquele ator que tanto queríamos conhecer e pelo qual esperamos horas, enquanto crianças, em filas intermináveis de lojas apenas por um autógrafo.
Assim é feita a vida de todos os que se deparam com um mundo cada vez mais mediatizado, feito de figuras que vemos e adoramos, mesmo que apenas as conheçamos da tela do cinema, das linhas do livro ou do som de um álbum. Para as pessoas da minha geração, falar por isso de heróis é algo tão comum que já nem sequer nos lembramos – até porque não vivíamos nesse tempo – dos momentos em que esses mesmos heróis não apareciam da mesma forma para o mundo. Ouvimos falar deles apenas nos testemunhos dos nossos pais ou avós, que passam o tempo a contar-nos que “naquele tempo é que era”. E esta é uma expressão que serve para tudo no quotidiano: se achamos que Messi e Ronaldo são os melhores jogadores de sempre, são eles que nos dizem que “naquele seu tempo, em que jogavam Pelé ou Maradona, aí é que era”. Peguei apenas no exemplo de jogadores de futebol mas tantos outros podiam ser dados.
Por tudo isto que vos disse, admito que não é fácil escrever este texto. Afinal de contas, não é fácil falar ou escrever sobre algo ou alguém que não vimos. Não é fácil entrar numa discussão ou sequer poder exprimir em palavras a devoção ou a gratidão que possamos ter por uma figura que tenha marcado os tempos que ainda não eram os meus. Por isso, não é fácil para mim falar de Eusébio da Silva Ferreira. É, porventura, a par de Maradona, o jogador que sempre me criou uma desilusão enorme por nunca ter conseguido perceber se, como me dizia o meu avô, “naquele tempo é que era”. Entre todas as conversas de jardim, fui crescendo a ouvir as histórias e os relatos daquele que seria para sempre a figura maior do desporto português. Uma figura que, a 25 de janeiro de 1942, nascia para o mundo em Lourenço Marques, Moçambique. Naquela altura, num período de ditadura fascista e de controlo colonial, Moçambique era apenas um ponto entre tantos no continente africano. Por isso, naquele dia de janeiro, ninguém adivinharia que, nos braços de Elisa Anissabeni, a mãe de Eusébio, estaria um dos homens que marcaria para sempre a história de Portugal.
Mais de setenta anos passados, olhar para a história de Eusébio é um exercício que serve de exemplo para muitos daqueles que constantemente perseguem os seus sonhos. O bairro de Mafalala foi apenas o ponto de partida para o sonho do Pantera Negra. Por entre os campos de terra e as bolas de couro com que, descalços, os meninos brincavam nas ruas moçambicanos, despontava o jeito de Eusébio, com a sua técnica inconfundível, fruto de um pé direito que desde cedo começava a fazer maravilhas. A primeira paragem foi numa equipa moçambicana denominada por “Os Brasileiros”. Por se chamar assim, os seus jogadores tinham alcunhas correspondentes a jogadores “canarinhos” desse tempo, como Garrincha e Didi. A de Eusébio era, curiosamente, Pelé. Não terá sido, com toda a certeza, por acaso que tal nome foi-lhe colocado. A sua velocidade, aliada a uma qualidade ímpar para alguém com tão pouca idade, fazia de Eusébio um projeto de jogador que podia ter o mundo a seus pés.
Eusébio foi a figura maior do Benfica Fonte: serbenfiquista.com
Apesar de ser benfiquista desde pequeno, a verdade é que, na passagem pela filial encarnada, o Desportivo de Lourenço Marques, Eusébio não foi bem recebido. Decidiu dar um novo rumo ao seu percurso e o próximo destino acabaria por ser o Sporting de Lourenço Marques. Dali até Alvalade, foi apenas um instante. Rapidamente os responsáveis leoninos viram que aquele era um menino que não podiam deixar fugir. Decidiram convidá-lo para treinar à experiência mas a verdade é que esse foi o primeiro momento em que o seu coração falou mais alto. Recusou o convite sportinguista e acabou por assinar contrato com o Benfica que, ao ver o interesse rival, ofereceu-lhe uma proposta que Eusébio acabou por aceitar. A 15 de dezembro de 1960, o Benfica colocou Eusébio num avião sob um nome falso (Ruth Malosso) e avisou os leões de que o jogador tinha partido para Lisboa de barco. O Sporting não desistiu, decidiu duplicar a oferta do Benfica, pagando na altura 250 contas â mãe de Eusébio. A verdade é que o Benfica acabou por esconder o rapaz de 18 anos num hotel em Lagos, evitando que ele fosse resgatado pelo rival de Alvalade. Naquele momento, e apesar do longo processo burocrático com os dois rivais, a verdade é que a assinatura de Eusébio era o compromisso para o início de uma história jamais esquecida pela nação benfiquista.
Na altura, dezoito anos de vida já pareciam uma eternidade para Eusébio. Entrava na idade adulta e o conflito que havia “gerado” entre os maiores clubes nacionais da altura já fazia dele uma figura incontornável do futebol português. Dentro de campo, rapidamente se percebeu o porquê de toda aquela disputa por Eusébio. Mesmo num plantel em que despoletavam nomes como José Augusto, José Águas e Mário Coluna, a verdade é que já ninguém ficava indiferente ao talento do jovem moçambicano. A estreia no Estádio da Luz remonta a 23 de maio de 1961, onde, numa partida com o Atlético, Eusébio fazia três dos quatro golos do Benfica. As peripécias que se sucederam desde a sua chegada atrasaram a assinatura do contrato, e a chegada “tardia” de Eusébio à equipa do Benfica fez com que tenha perdido a primeira das duas conquistas da Taça dos Clubes Campeões Europeus, em 1961, em Berna, na vitória dos encarnados por 3-2 contra o FC Barcelona. Por falar em conquistas europeias, apenas um ano depois o Benfica voltava a tocar o céu do futebol europeu e, numa memorável vitória por 5-2 frente ao Real Madrid, destacava-se um nome: Eusébio. Com dois golos apontados naquela noite perante o colosso espanhol – que contava com Puskas e Di Stéfano, dois dos maiores jogadores da história madrilena – o menino nascido no Bairro da Mafalala começava a mostrar ao mundo do futebol todo o seu potencial, fazendo com que a célebre revista France Football lhe tenha mesmo atribuído, em 1962, o segundo lugar na Bola d´Ouro.
O Pantera Negra recebeu a Bola de Ouro em 1962 Fonte: francefootball.fr
Falar do percurso de Eusébio é falar de vitórias. Não há volta a dar: ao serviço do Benfica e da seleção nacional, a velocidade estonteante e o potente remate faziam do número 10 benfiquista o ídolo maior de todos os portugueses. A nível coletivo, para além da vitória em 1962, destaque para os onze campeonatos e as cinco taças de Portugal ganhas ao serviço do Benfica. A nível individual, basta apenas passar os olhos por todas as distinções para saber quem era Eusébio da Silva Ferreira: foi eleito melhor jogador do mundo em 1965, vencedor de duas “Botas de Ouro” em 1968 e 1973; melhor goleador do campeonato português em sete ocasiões e duas vezes melhor marcador europeu. No verão de 1966, liderando a célebre seleção dos “magriços”, Eusébio ficaria na história da seleção nacional como a principal figura da equipa que conseguiu a melhor participação de sempre em campeonatos do mundo. Na memória de todos ficaram os dois golos que marcou na vitória por 3-1 sobre o Brasil, os quatro golos apontados na vitória por 5-3 contra a Coreia do Norte nos quartos-de-final ou as lágrimas com que deixou o relvado depois da derrota nas meias finais frente à equipa inglesa.
E por falar em números, aquilo que indiscutivelmente mais se destaca são o número quase absurdo de golos que apontou. No total, foram 546 os golos que marcou pela seleção portuguesa e ao serviço dos clubes por que passou. Pelo Benfica, foram 473 golos em 440 jogos oficiais. Mas com os golos, veio também o calvário de alguém que foi vítima da falta de proteção que jogadores do seu talento tinham na altura. A sua carreira andou entre a glória e a dor, com seis operações ao joelho esquerdo e uma ao joelho direito. Impedido por ordem de Salazar de aceitar os inúmeros convites que lhe chegavam de Espanha e Itália, só depois de terminada a ditadura é que Eusébio saiu de Portugal, passando pelos Estados Unidos (Boston Minutemen, Las Vegas Quicksilvers e New Jersey Americans), Canadá (Toronto Blizzard) e México (Monterrey), com dois regressos pelo meio para representar Beira Mar e União de Tomar. Esta última passagem foi apenas uma breve experiência que durou até Março de 1978, após o qual regressou ao EUA.
Em muitos dos casos, os números são algo demasiado curto para se perceber a importância de alguém. Isso indiscutivelmente acontece no caso de Eusébio. Por muitos golos, assistências e vitórias que tenha dado ao Benfica e à seleção portuguesa, a verdade é que Eusébio da Silva Ferreira sempre foi muito mais do que simples recordes no futebol. Por isso é que, depois de terminar a carreira, ele viu ser-lhe reconhecido o talento. E não podia ser de outra forma, pois foi reconhecido pelo seu Benfica, o clube que lhe deu a maior oportunidade da sua vida e o clube onde teve os melhores momentos da sua carreira. A estátua, em frente ao Estádio da Luz, é apenas o símbolo maior com que nos deparamos quando chegamos à casa benfiquista. Ali, naquela figura, Eusébio é retratado como se estivesse em campo, pronto para fazer mais um dos seus remates lendários e que tantos sorrisos deram aos portugueses no século XX.
Eusébio foi figura de destaque no Mundial 1966 Fonte: imortaisdofutebol.com
Esse é, por ventura, o maior dos créditos que pode ser dado a Eusébio. Hoje em dia, num mundo tão mediatizado, falar-se da importância de um jogador de futebol numa sociedade é sempre relativo. Na altura de Eusébio, a história era completamente diferente. Num país oprimido por uma ditadura retrógrada, Eusébio da Silva Ferreira era a figura que fazia os portugueses sonharem. No meio dos remates, dos golos, das vitórias e das alegrias que deu ao país, Eusébio era o menino que fazia um povo acreditar que era possível ter um futuro melhor. Mesmo que por breves momentos, o futebol de Eusébio ficou, nas décadas de sessenta e setenta, como uma marca que o tempo jamais conseguirá retirar da história.
Como vos disse no início do texto, é-me difícil falar do que foi Eusébio. Não o vi jogar e não presenciei os momentos em que Eusébio mostrou o porquê de ter sido considerado pela FIFA como um dos melhores da história do futebol mundial. Ainda assim, não posso deixar de perceber, quase um ano e meio depois da sua morte, que a saudade seja enorme pela seu desaparecimento. Naquela manhã de 5 de janeiro de 2014, fui deparado com a notícia da morte de Eusébio. Vítima de paragem cardiorrespiratória, aquela noite havia sido a última da vida do Pantera Negra. Aquilo que deveria ser um domingo como outro qualquer, estava agora marcado por uma das notícias mais tristes que os amantes do futebol poderiam receber.
A partir daquele dia, algo faltou no Benfica e no país. Por ventura, para todos aqueles que não gostam tanto de futebol, ler estas linhas será quase uma heresia. No entanto, tudo aquilo que se seguiu à triste notícia terá sido o exemplo maior daquilo que era Eusébio. As alegrias que havia dado aos adeptos em vida davam agora lugar às lágrimas. Em pleno relvado do Estádio da Luz, foram milhares os que quiseram dizer um último adeus a Eusébio da Silva Ferreira. Durante dois dias, o país parou para perceber que algo de muito importante se tinha perdido. Era Eusébio, aquele menino vindo do Bairro de Mafalala e que agora seria apenas uma recordação. Desde a igreja até ao cemitério do Lumiar, ouviram-se buzinas e aplausos na despedida ao ídolo. A chuva não demovia ninguém e vários eram os milhares que seguiam junto ao carro fúnebre, para partilharem um último momento com uma das maiores figuras de sempre de Portugal. Mesmo que coberta com a bandeira do Benfica, a verdade é que a morte de Eusébio não foi apenas a morte de alguém do Benfica. A morte de Eusébio foi a morte de alguém que marcou para sempre o país e cujo talento quebrou toda e qualquer barreira clubística. Por isso, não foi de estranhar os inúmeros cachecóis e adeptos de equipas rivais que partilharam o momento e a dor com todos os que choravam pela morte de Eusébio.
A despedida a Eusébio juntou milhares no Estádio da Luz Fonte: globoesporte.globo.com
Foram milhares aqueles que se aglomeram junto ao Estádio da Luz, numa primeira fase, e depois no cemitério à espera da chegada da urna. Junto à campa onde foi sepultado, os gritos de apoio ao Pantera Negra ecoaram pelo país e pelo mundo. Os aplausos foram uma constante e, por entre flores e bandeiras, a recordação de uma vida de vitórias e conquistas foi feita por todos aqueles que foram marcadas pelo talento de Eusébio da Silva Ferreira.
Enquanto adepto de um clube rival, não tive, com toda a certeza, o mesmo sentimento que todos os benfiquistas tiveram. Obviamente que não senti da mesma forma o momento em que o hino encarnado foi tocado no relvado da Luz, com milhares de adeptos de frente perante Eusébio. Ainda assim, e tal como escrevi ao longo destas linhas, o facto de Eusébio ser apenas uma memória para mim, isso não invalida que o adeus ao Pantera Negra não tenha sido um momento que para sempre guardarei na minha memória. E é por isso que Eusébio chega ao lugar onde os maiores da história portuguesa estão: ao Panteão Nacional. Será aí a sua última morada e será o ponto de chegada de um percurso marcado pelos sonhos, pelas vitórias, pelas alegrias e pelas tristezas que marcaram a vida de um homem que foi maior do que tudo em Portugal. E, para perceber isso, bastou ver o adeus a Eusébio para entender que, tal como dizia o meu avô, de facto, “naquele tempo é que era”. E sim, porque como Eusébio nunca haverá igual. E é por isso que a sua memória jamais será esquecida. Porque os heróis nunca desaparecem. Até sempre, Rei!